“NO VOSSO CAMINHO, PROCLAMAI: O REINO DOS CÉUS ESTÁ PRÓXIMO” (Mt 10,7)
Apresentação da Região América Cone Sul
1. Situação cultural, social e religiosa
hoje
– 2. Os inícios da presença salesiana
2.1 Argentina. Na
Patagônia 2.2 Uruguai 2.3 Brasil. 2.4 Chile. A Prefeitura Apostólica
de Punta Arenas 2.5 Paraguai – 3. A presença salesiana
3.1
Vida religiosa. Vocação e vocações 3.2 Vida fraterna das comunidades
3.3 Missão salesiana. Setor Escola. Escolas Agrícolas e Centros de
Formação Profissional. Setor Marginalização. Setor Paróquias. Serviços
eclesiais. Participação e formação dos leigos 3.4 Formação
inicial e permanente. Formação inicial. Formação permanente. 3.5
Família Salesiana. 3.6 Comunicação social. 3.7 Animação missionária –
4. Importância da Região América Cone Sul para a obra salesiana na
América e no mundo
. A santidade na Região Cone Sul. O trabalho social
dos salesianos na Região. Contribuição dos salesianos para a ciência.
As instituições universitárias – 5. Desafios e prospectivas de futuro
.
5.1 Os desafios. 5.2 Prospectivas – Conclusão
8 de setembro de 2005
Natividade da B. V.
Maria
Caríssimos irmãos,
eu vos escrevo esta carta com o afeto de sempre e com uma
viva esperança: a de chegar a todos vós, onde quer que vos encontreis. Quereria
tornar-me presente nos mais diversos contextos e nas mais variadas situações
em que viveis e realizais o programa missionário de Jesus: anunciar o Reino,
que outro não é senão o próprio Deus com sua vontade de vir ao nosso encontro,
e construí-lo mediante obras que o tornam presente e crível: “Curai doentes,
ressuscitai mortos, purificai leprosos, expulsai demônios” (Mt 10,8).
Desde a primeira expedição missionária, o nosso amado Pai
Dom Bosco quis responder à compaixão de Jesus diante das multidões, descritas
quais “multidões sem pastor”. E ele próprio que, nos anos do Colégio Eclesiástico,
acariciara o sonho de ser missionário, tornou-se fundador de uma Congregação
missionária. Apenas um ano depois da aprovação das Constituições, Dom Bosco
deu início à epopéia da América enviando os seus primeiros missionários, que,
com o anúncio do Reino, levaram o Evangelho salesiano da alegria, da esperança
e da vida.
Continuando a apresentação das Regiões salesianas, quero
mostrar-vos nesta carta a Região América Cone Sul. Constituída durante o CG24,
ela compreende um grupo de cinco nações (Argentina, Uruguai, Brasil, Chile
e Paraguai) que, já em sua história civil, tiveram entre si uma relação muito
estreita.
1. SITUAÇÃO CULTURAL, SOCIAL E RELIGIOSA HOJE
Para enquadrar a presença salesiana no Cone Sul parece-me
oportuno apresentar-vos um quadro geral da situação dos países que a compõem.
Convém dizer logo que não se trata exatamente do contexto que encontraram
os primeiros missionários salesianos. Hoje a situação está muito mudada; vivem
nessa parte do continente americano cerca de 248 milhões de habitantes: a
Argentina tem 38 milhões, o Brasil 184 milhões, o Chile 16 milhões, o Paraguai
6 milhões e o Uruguai 3,5 milhões.
Quanto a recursos materiais, todos esses países são ricos,
mas uma não correta situação econômica faz com que possam conviver, a breve
distância e num mesmo contexto, o chamado Primeiro Mundo, o mundo dos ricos
ultrabilionários, e o Terceiro Mundo, o mundo das favelas, habitadas por famílias
e grupos sociais situados à margem da sociedade.
No campo econômico e social não se fizeram grandes progressos,
porque a política de cunho neoliberal se choca frontalmente com as solenes
declarações dos direitos humanos. A política neoliberal acentuou a polarização
social entre pobres e ricos, sem uma justa distribuição de renda; antes, criou
por um lado a concentração da renda em favor de uma estreita faixa social
e, por outro, reduziu ou mesmo zerou a despesa social, provocando conseqüentemente
a marginalização e o empobrecimento de crescentes faixas de trabalhadores,
o aumento do desemprego, a criação das favelas nas cidades, a fome e a miséria
no campo. Surgiu assim o fenômeno do crescimento do número de crianças e adolescentes
que nas ruas pedem esmola, se arranjam com pequenas atividades comerciais
e começam a delinqüir. Acrescente-se a pesadíssima dívida interna e externa,
que constitui um forte condicionamento para qualquer investimento em projetos
sociais ou de infraestrutura.
A falta de uma política agrícola provocou o êxodo rural,
dando assim origem a um maciço fenômeno de urbanização, cujo primeiro resultado
foi o aumento da pobreza na periferia das cidades. O sistema educativo perde
a cada ano um número considerável de crianças e jovens, que não completam
os cursos normais. A exclusão da escola contribui assim para o aumento do
desemprego e da delinqüência de menores. A exploração dos menores manifesta-se
no envolvimento deles no mundo do trabalho ou em atividades criminosas e ilícitas,
como venda de droga, prostituição, roubo.
Os países da região têm ainda uma grande tradição católica,
com grandes expressões de religiosidade popular. A Igreja Católica goza de
grande prestígio: é uma das instituições que inspiram maior confiança na opinião
pública, por se mostrar profundamente inserida no contexto social. Vive e
sofre a situação do povo. Dessa perspectiva, o Uruguai é o único país que
revela uma atitude constrastante. Com efeito, a chamada liberdade religiosa
é mais que tudo uma declaração de princípio, ao passo que a posição do Estado
é claramente arreligiosa e sutilmente anticlerical.
Deve dizer-se também que, nestes últimos anos, toda essa
área da América sofreu um forte movimento de secularização. Cumpre notar também
que, historicamente, o número de sacerdotes foi sempre insuficiente, e os
leigos foram e são ainda hoje uma força preciosa no campo da evangelização
e para a manutenção da fé.
2. OS INÍCIOS DA PRESENÇA SALESIANA
Não por acaso Dom Bosco escolheu estas terras, mas como
lugar que a Providência tinha indicado para a primeira experiência missionária
da Congregação Salesiana. Os salesianos, por sua vez, sempre consideraram
a Patagônia como a “terra prometida” por Deus a Dom Bosco, lembrando como
ele próprio viu, no sonho de 1871 ou 1872, os missionários salesianos que,
através dos meninos a eles confiados, conseguiam a conversão dos povos da
Patagônia.1
Em 1875, um ano após a aprovação das Constituições, Dom
Bosco enviava os seus salesianos à Argentina, sob a direção de um dos seus
filhos prediletos, o padre João Cagliero2. Dom Bosco amou muito aquela terra a ponto de chamá-la “sua segunda
pátria”.
Em 1876 foi a vez do Uruguai. Uma expedição missionária,
chefiada pelo padre Luís Lasagna fundava a Casa de Villa Colón. Do Uruguai,
os salesianos foram ao Brasil em 1883, e ao Paraguai em 1896.
Nesse meio tempo, os salesianos havia chegado ao Chile em
1887, ano em que foi fundada a casa de Concepción. Seguiu-se a ela, em 1888,
a casa de Talca. Em 1891, com a aceitação da obra de “La Gratitud Nacional”,
em Santiago, consolidou-se a presença salesiana nesse país.
Para um desenvolvimento tão veloz contribuiu o fato de a
imprensa francesa, que era muito lida nos países citados, falar muito de Dom
Bosco. Cumpre destacar também a benevolência de muitos bispos, entre os quais
dom Frederico Aneyros, arcebispo de Buenos Aires, o servo de Deus dom Jacinto
Vera, bispo de Montevidéu, dom Pedro Maria de Lacerda, bispo de Rio de Janeiro.
De grande importância foi também o apoio das Conferências de São Vicente de
Paulo, que muito se interessavam pela educação dos jovens pobres e abandonados.
O Boletim Salesiano e as Leituras Católicas,
além de outras revistas publicadas pelos salesianos, difundiram por toda a
parte o conhecimento de Dom Bosco, do seu sistema educativo e o interesse
para socorrer a juventude pobre e abandonada.
2.1 Argentina
Chegados à Argentina, os salesianos se empenharam em acompanhar,
em Buenos Aires e em San Nicolás de los Arroyos, a colônia italiana, seguindo
as recomendações de Dom Bosco.
Verdadeira bênção para aqueles pobres imigrados, os salesianos
não encontraram sempre a compreensão do clero e da sociedade de Buenos Aires.
Com a aquisição do terreno e da Casa de Almagro, os salesianos entraram na
posse de um sítio de sua propriedade. Bem logo iniciaram uma campanha catequética
em grande estilo, introduziam os certames catequéticos e imprimira 800 mil
cópias do catecismo diocesano. Em 1882 organizou-se a Pia União dos Cooperadores;
em 1888, em memória de Dom Bosco, fundou-se a Obra de Maria Auxiliadora para
as vocações. No inspetorado do padre Tiago Costamagna, as obras salesianas
chegaram ao interior da República. Com a escola agrícola de Uribelarrea, os
salesianos passaram a atender os filhos dos camponeses. Entrementes, em 1879,
haviam chegado à Argentina as Filhas de Maria Auxiliadora, que logo se espalharam
por diversas partes da República.
Para comemorar os vinte e cinco anos da chegada dos salesianos
celebrou-se em Buenos Aires o Segundo Congresso Internacional dos Cooperadores
Salesianos, em novembro de 1900. O padre Paulo Albera presidiu o Congresso
em nome do padre Rua. Nele tomaram parte seis bispos e os inspetores da Argentina,
Uruguai, Paraguai e Brasil. Frutos do Congresso foram a dedicação a Jesus
Redentor e a Maria Auxiliadora da Igreja de S. Carlos de Almagro e a fundação
da Escola Jesus Redentor, para os órfãos de Dom Bosco, em Maldonado.
No que dizia respeito à Congregação, realizou-se também
o Primeiro Capítulo Salesiano Americano, com a participação dos inspetores
da Argentina, do Uruguai, do Sul do Brasil e do Mato Grosso. Foi presidido
pelo padre Paulo Albera. Os temas tratados referiam-se à observância religiosa,
à formação, ao sistema educativo de Dom Bosco, à economia, às relações com
as FMA, aos oratórios festivos, às cerimônias, à música e às companhias religiosas.
“Naquele ano – escreveu o padre José Vespignani – notou-se em todos nós um
despertar de afeto e de espírito salesiano”.
Para o centenário do nascimento de Dom Bosco (1915), o arcebispo
de Buenos Aires publicou uma carta pastoral na qual fazia uma bela descrição
da ação dos salesianos e das FMA que trabalhavam no país. Apresentava os números
globais dos jovens de ambos os sexos que eram educados “com um método e com
o mesmo espírito de caridade ativa e paciente que o sábio fundador soube imprimir
na sua obra providencial”. Dizia que considerava os salesianos “uma nova manifestação
do poder e da bondade de Maria Auxiliadora para salvar a sociedade”.
Naquele mesmo ano foram fundados os “Exploradores Don Bosco”,
um movimento juvenil nascido da longa visão do padre Vespignani, à semelhança
dos escoteiros de Baden Powell, mas com uma clara orientação cristã e salesiana.
Com o tempo, eles chegaram a realizar verdadeiras missões em diversas cidades
da república argentina. Em 1940, os Exploradores Don Bosco chegaram a 45 batalhões.
Em 1980 a 65, com 9 mil jovens dos salesianos, aos quais se acrescentam 25
esquadras, com 2 mil componentes, dos colégios das FMA.
Merece uma menção particular o esforço feito pelos salesianos,
primeiro dos quais o padre Aquiles Pedrolini, para difundir a devoção a Maria
Auxiliadora na Argentina. Em Rodeo del Medio foi construído em sua honra um
santuário, que se tornou meta de numerosas peregrinações. Dia 8 de outubro
de 1916, o bispo de Cuyo coroou a imagem de Maria Auxiliadora num parque público
da cidade. Estavam presentes outros dois bispos e alguns dignitários eclesiásticos.
Foram cerca de oito mil as pessoas que tomaram parte no evento.
Na Patagônia
Após um primeira tentativa sem resultado, os salesianos
chegaram à Patagônia em 1879. Em 1880 foram encarregados oficialmente dessa
missão. Em Roma, Dom Bosco cuidava das tratativas para a criação de um Vicariato
Apostólico, e em 1883 monsenhor João Cagliero foi nomeado vigário apostólico.
Para resolver as dificuldades legais, o arcebispo de Buenos Aires, dom Frederico
Aneyros, nomeou Cagliero seu vigário geral para a Patagônia, com todas as
faculdades episcopais, e incluiu no balanço da arquidiocese o das missões.
Muito diversificada foi a ação de evangelização e de civilização
desenvolvida pelos salesianos naquelas terras. Os salesianos e as FMA transpuseram
para o trabalho missionário muitos elementos típicos de sua experiência formativa:
música instrumental, canto, declamações, representações teatrais e pequenas
rifas traziam àqueles lugares desertos um sopro de alegria e a esperança de
uma vida diferente. O missionário chegava onde muitas vezes não conseguia
chegar a ação do poder público. Os habitantes dos pequenos centros harmonizavam-se
e formavam comunidade ao redor da missão.
Foram instituídas as associações religiosas masculinas e
femininas, para que os fiéis não ficassem isolados e abandonados a si mesmos.
Quando as condições econômicas e sociais o exigiam, instituíram-se também
sociedades de mútuo socorro. Difundiram-se entre o povo as devoções ao Sagrado
Coração de Jesus, a Maria Auxiliadora e, depois da morte do Fundador, ao próprio
Dom Bosco.
No campo da educação escolar, as missões supriam o Estado,
quando este era inexistente. Iniciaram-se as escolas de artes e ofícios e
começou-se a dar também um ensino prático de técnicas agrárias, valorizando
um terreno apropriado adquirido pela missão. Em Viedma foi possível construir
o primeiro e único hospital do território. As FMA, por sua vez, velavam à
cabeceira dos enfermos e iam assistir os doentes em suas casas e até nas tendas
dos índios. Tinham suas escolas e também um orfanato para as filhas dos índios.
Para comemorar o cinqüentenário das Missões Salesianas foi
inaugurado um colégio salesiano em Comodoro Rivadavia e benta a igreja anexa
de Santa Luzia. Em Buenos Aires foi organizada uma Exposição Profissional
Didática, e realizaram-se o IX Congresso Internacional dos Cooperadores Salesianos
e o II Congresso Internacional dos Ex-alunos, presidido pelo padre José Vespignani,
representante do padre Filipe Rinaldi. Um desfile de 12 mil jovens, alunos
e alunas dos colégios dos salesianos e das FMA, coroou as solenes celebrações.
Como fruto do Congresso foi proposta a criação de uma nova casa para jovens
pobres e abandonados.
Por ocasião da beatificação de Dom Bosco, as autoridades
civis e religiosas se uniram a toda a Família Salesiana nos solenes festejos
promovidos em Buenos Aires. Em La Plata, a Província de Buenos Aires erigiu
um monumento ao grande educador. Foi uma iniciativa do Governo daquela Província.
Em Buenos Aires, o busto de Dom Bosco foi colocado na sala do conselho Nacional
de Educação.
1.2 Uruguai
A chegada dos salesianos ao Uruguai se deu de maneira realmente
fortuita. O país se modernizava no governo de Lourenço Latorre, e se desenvolvia
rapidamente com a ajuda do capital estrangeiro, especialmente inglês. Foram
então construídos novos bairros em Montevidéu e também nos arredores, como,
por exemplo, em Villa Colón.
Essa localidade desejava ter um colégio que fosse o que
de melhor se pudesse encontrar na República Oriental. Enquanto se construíam
as paredes, os seus promotores – que eram protestantes – pediram à Sociedade
dos Amigos da Educação do Povo um plano de estudos para ser aplicado nesta
sua escola. Nasceu aí um dos clássicos da pedagogia latino-americana, o livro
de Jose Pedro Varela, La Educación del Pueblo.
Tratava-se, nesse ponto, de encontrar quem pusesse em prática
essas intuições pedagógicas. Coube aos salesianos a concretização da idéia.
Desde 1875 achava-se em Buenos Aires o padre João Cagliero. Fez uma visita
a Montevidéu e no dia 24 de maio de 1876 comunicou a Dom Bosco a notícia da
aceitação do novo colégio. Em 26 de dezembro daquele ano, o padre Luís Lasagna,
com outros salesianos, desembarcava em Montevidéu e se instalava na nova casa.
Os missionários se viram mergulhados numa sociedade culturalmente
refinada, que exigia deles não pouca habilidade para sustentar o confronto
sobre o plano escolar e educativo. Não agradaram aos círculos anticlericais,
dominantes no ambiente da escola em Montevidéu, as mudanças que os salesianos
faziam no plano de estudos proposto por Varela. A crise foi brilhantemente
superada com vigilância e firmeza pelo padre Lasagna. Havia, de fato, conquistado
a confiança e o coração da maioria dos alunos e suas famílias, e foram justamente
os próprios alunos que se puseram em defesa do colégio que já consideravam
deles.
Nomeado inspetor do Uruguai e do Brasil em 1880, o padre
Lasagna seguiu as sugestões dadas pelo padre Francisco Bodrato e pelo padre
Rua. Pôs-se à procura de novos campos de trabalho. As escolas de São Francisco
de Paula, pertencentes às Conferências de São Vicente de Paulo, a paróquia
de Las Piedras, com a casa de formação anexa, e a de Paysandu-Rosario, com
o colégio anexo, passaram aos salesianos. Vieram depois Mercedes, Paysandu-San
Ramón, Montevidéu-Sagrado Coração e os Talleres Don Bosco. Na periferia de
Montevidéu promoveu-se a iniciativa da Sociedade dos Oratórios Festivos; nela
coordenavam-se dez oratórios abertos pelo próprio padre Lasagna. Depois da
morte desse grande pioneiro e missionário, a Inspetoria do Uruguai e Brasil
foi dividida em duas. Uruguai e Paraguai formaram uma inspetoria.
Dom Lasagna apoiara firmemente a fundação dos Círculos Operários
Católicos. Ao próprio padre André Torrielli, que cuidava do primeiro círculo
e queria fazer-se salesiano e colocar-se sob a sua obediência, deu logo como
primeiro encargo, o de não abandonar os Círculos. Os salesianos ajudaram os
Círculos a formarem-se nas cidades do interior, sobretudo onde tinham suas
obras.
Em 1905, a casa de formação de Las Piedras transferiu-se
para a Escola Agrícola Juan Jackson, que Dom Solera em 1898 entregara aos
salesianos. Em 1910, foi fundado o Centro Cristóvão Colombo para atendimento
e animação dos ex-alunos. Em 1915 inaugurou-se em Villa Colón o monumento
a Dom Luís Lasagna.
No cinqüentenário da fundação do Colégio Pio, o padre Héctor
Sallaberry teve a idéia de celebrar o aniversário jubilar promovendo a Obra
dos Exercícios Espirituais. O empreendimento foi apoiado pelos ex-alunos e
em poucos meses surgiu, em Villa Colón, a primeira casa de Exercícios Espirituais
da Congregação. Surgiu, depois, a proposta dos Exercícios Espirituais pelo
rádio: a iniciativa teve grande sucesso espiritual e apostólico.
No que respeita à devoção a Maria Auxiliadora, em 1898 o
arcebispo de Montevidéu tinha pedido que em Villa Colón, na igreja do Colégio
Pio, se erigisse um templo votivo nacional a Maria Auxiliadora. Em 14 de dezembro
de 1901, Sua Excelência inaugurou o Santuário de Maria Auxiliadora, e em outubro
de 1904, a imagem que ali se venera foi solenemente coroada.
2.3 Brasil
Em 1877, dom Pedro Maria de Lacerda, bispo de Rio de Janeiro,
escrevia a Dom Bosco pedindo os salesianos para sua diocese.3
Indo depois a Turim, deixou, antecipadamente, o dinheiro
para as passagens dos missionários que um dia iriam ao seu país. No Estado
de Rio Grade do Sul, os capuchinhos tinham feito muita publicidade dos salesianos,
que conheciam no Uruguai, e o bispo de Porto Alegre pediu ao inspetor dom
Luís Lasagna enviasse os salesianos á sua diocese.
Dom Lasagna, por orientação de Dom Bosco, foi ao Brasil
em 1882. Fez uma longa viagem ao longo da costa do país, até Belém do Pará,
e decidiu começar a obra salesiana naquela nação a partir de Niterói, com
o Colégio Santa Rosa. Dia 14 de julho de 1883, ele próprio chegava ao Rio
de Janeiro com os primeiros salesianos; vieram depois as casas de São Paulo
(1885) e de Lorena (1890). Em 1891 aceitou a casa de Recife, que, porém, só
se abriu em 1894. Feito bispo de Oca-Tripoli, dom Lasagna fundou a casa de
Cuiabá e a Colônia Teresa Cristina, primeira missão entre os índios Bororos
(1894).
As casas do Brasil dependiam então da Inspetoria do Uruguai-Brasil.
A situação permaneceu assim até à morte de dom Lasagna, quando as casas do
Brasil se organizaram em inspetoria; dessa primeira inspetoria brasileira
nasceu, não muito tempo depois, a Inspetoria do Mato Grosso.
Abriram-se logo as duas casas já aceitas por dom Lasagna:
Campinas, no Estado de São Paulo, e Cachoeira do Campo, em Minas Gerais. Depois
foi a vez do Colégio de Corumbá em Mato Grosso, de Salvador na Bahia, da Colônia
Agrícola de Jaboatão em Pernambuco, da Escola Agrícola da Tebaida em Sergipe.
O desenvolvimento foi tão veloz que já em 1901 formaram-se
três Inspetorias: a do Sul do Brasil, a de Mato Grosso e a do Norte, que ia
da Baía à região amazônica.4 Um ano depois, os salesianos, que tinham perdido a Colônia Teresa
Cristina devido a novas opções políticas dos governantes de Mato Grosso, criaram
uma missão precisamente na região oriental do Estado, com os Bororos orientais.
Não dispondo de uma organização econômica suficiente para
sustentar suas estruturas educativas, os salesianos tiveram logo de ceder
à pressão da sociedade e encaminhar seus colégios para o ensino superior,
deixando as escolas profissionais em segundo lugar. A Congregação no Brasil
respirou desde então com os dois pulmões das escolas e dos oratórios.
Como na Argentina e no Uruguai, também no Brasil, os salesianos
procuraram desde o início difundir a devoção à Madona de Dom Bosco. Como diretor,
o padre Luís Zanchetta, espalhou essa devoção em todo o Brasil por meio das
Leituras Católicas e muitos folhetos de propaganda. Foi assim possível
construir, na colina que sobranceia o Colégio Santa Rosa, em Niterói, o monumento
a Maria Auxiliadora, que se tornou meta de peregrinações e primeiro sinal
religioso no panorama da baía de Guanabara, quando não havia ainda sido construído
o grande Cristo do Corcovado.
Para solenizar o Centenário da Festa Litúrgica de Maria
Auxiliadora, instituída por Pio VII pela libertação do cativeiro napoleônico,
e o Centenário do Nascimento de Dom Bosco, de 28 a 30 de outubro de 1915 realizou-se
em São Paulo o VII Congresso Internacional dos Cooperadores Salesianos. Teve
como tema “A restauração social em Cristo”, que, conforme declaram os documentos,
devia ser efetivada pelo trabalho e pela educação. Como fruto do Congresso
foi fundada no bairro do Bom Retiro, ao lado da paróquia salesiana, uma nova
casa salesiana destinada a dar instrução profissional aos jovens pobres.
2.4 Chile
No Chile, Dom Bosco e os salesianos eram conhecidos e muito
apreciados em Santiago, Valparaiso, Talca e Concepción. O livro Dom Bosco
e sua Obra, do bispo titular de Miklo, o espanhol dom Marcelo Spinola,
tinha tido uma grande difusão no país. Indo à Itália em 1869 e 1887, personalidades
do Chile tiveram oportunidade de conhecer a grandeza extraordinária do santo
dos jovens; um dele, padre Blas Cañas, fundou em Santiago em 1872, por indicação
do padre Rua, o Patrocínio de São José.
Todavia, Dom Bosco só começou a pensar nas missões do Chile
em 1876. Escreveu ao bispo de Concepción pedindo informações para uma
futura obra, e ao mesmo tempo propunha a fundação de três casas: Santiago,
Valparaiso e Concepción. O primeiro salesiano em terras chilenas foi o padre
Domingos Milanesio, que narrou sua viagem a Concepción no Boletim Salesiano
de março de 1886. Os salesianos começaram seu trabalho apostólico com
as escolas profissionais para meninos pobres, os oratórios festivos, o cuidado
pastoral dos bairros mais pobres e com as missões entre os indígenas do Estreito
de Magalhães.
Na morte de Dom Bosco, as casas salesianas no Chile eram
três: Concepción, Punta Arenas e Talca. Um grupo muito qualificado de cooperadores
salesianos tinha preparado a chegada dos salesianos em Concepción e em Talca
e os esperava em Santiago e Valparaiso. Ninguém havia preparado a chegada
dos salesianos a Punta Arenas.
Na morte do padre Rua, as casas salesianas no Chile eram
14. Quatro delas – La Serena, Santiago, Talca e Concepción – eram escolas
de Artes e Ofícios para jovens pobres, aos quais se proporcionava também hospitalidade
num internato anexo. No Colégio San José de Punta Arenas havia um pequeno
grupo de meninos que se formava nas oficinas de sapataria, marcenaria, tipografia
e encadernação. Os institutos comerciais eram três: Iquique, Valparaiso e
Valdivia. Em Linares e Punta Arenas havia uma escola elementar. O Patrocínio
de São José era um internato com cursos elementares e médios. O Aspirantado
e o Noviciado tinha sido instalados em Macul, Santiago. Os salesianos tinham
Paróquias somente em Punta Arenas e Porvenir. Merece especial menção a casa
de La Gratitud Nacional em Santiago, que compreendia o Asilo da Pátria e o
templo da Gratitud Nacional ao Sagrado Coração.
O trabalho missionário que se fazia em Magalhães e a atenção
dada aos meninos pobres, unidos às características do otimismo e do dinamismo
típicas de Dom Bosco e do espírito salesiano, tinham suscitado o apoio das
autoridades civis e religiosas e dos católicos em geral. A imprensa também
contribuía para tornar conhecido e apreciado o mundo salesiano. Em 1907 começou-se
a publicar o folheto El mensajero de Maria Auxiliadora e as Leituras
católicas.
Pensou-se naquele tempo em ter duas inspetorias no Chile.
As obras da Prefeitura Apostólica de Magalhães tiveram como inspetor, de 1887
até à sua morte, dom José Fagnano. Em 1892 foi criada a Inspetoria de São
Gabriel com sede em Santiago. Cumpre notar que até 1902 dependiam desta inspetoria
também as obras do Peru e da Bolívia.
Nesse período também as FMA entraram no Chile, tanto nas
missões do Sul como nas regiões do centro e do Norte do país. Em 1910 tinham
10 casas. Em 1896, a Madre Geral, Madre Catarina Daghero, visitou a Missão
da Ilha Dawson.
A Prefeitura Apostólica de Punta Arenas
Em 1882, o padre Concha propunha a Dom Bosco a fundação
de uma casa em Punta Arenas, encaminhando destarte as missões entre os índios
da Terra do Fogo. Em 1883, após várias tratativas feitas por Dom Bosco, a
Sagrada Congregação da Propagação da Fé criava a Prefeitura Apostólica da
Patagônia Meridional, com sede em Punta Arenas. Ela compreendia também a Terra
do Fogo, as Ilhas Malvinas e as outras ilhas existentes na região.
O padre José Fagnano foi nomeado Prefeito Apostólico. Em
outubro de 1886 ele partia de Buenos Aires com uma expedição científico-militar
para explorar a Terra do Fogo. Enquanto evangelizava e batizava os indígenas,
convenceu-se de que a sede da Prefeitura devia ficar em Punta Arenas. Para
as missões entre os indígenas, Mons. Fagnano preferiu o sistema das “reduções”,
como as criadas pelos jesuítas no Brasil e na Bolívia, ao dos missionários
itinerantes, como se costumava fazer na Patagônia. Em março de 1889 deu-se
início à missão da Ilha Dawson. O mesmo dom Fagnano, indo a Santiago em 1880,
obteve a concessão da ilha por vinte anos. Na sua missão, os salesianos receberam
índios Alakaluf e posteriormente os Onas.
As FMA se ocupavam das mulheres e das meninas. Juntamente
com o catecismo ensinavam-nas a ler, escrever, cozinhar, lavar e remendar
as roupas, a conhecer as normas mais elementares de limpeza e de higiene,
a cantar, costurar, trabalhar em sapatos.
Chefe e animador incansável de tudo era dom Fagnano, que
visitava freqüentemente as missões e viajava a Santiago ou à Europa para prestar
contas ao Estado do trabalho feito, para superar problemas especiais conversando
com as autoridades competentes ou, mais simplesmente, para recolher recursos
necessários às missões.
Posteriormente surgiram contrastes com a diocese de Ancud
por causa da administração eclesiástica de Punta Arenas. A questão foi levada
a Roma. Foi assim que, em 1916, foi criado o Vicariato Apostólico de Magalhães,
independente da diocese de Ancud, e nomeado vigário apostólico o salesiano
dom Abraham Aguilera Bravo.
Foram grandes os festejos quando da beatificação de Dom
Bosco (1929), que se celebraram no mês de maio em Talca, em Punta Arenas e
com um solene tríduo em Santiago. A imprensa contribuiu para criar um clima
de admiração pela figura do apóstolo da juventude e pela sua obra. Com amorosa
adesão ao novo beato, os ex-alunos realizaram seu terceiro Congresso, no qual
se estudou o método educativo de Dom Bosco.
Também no Chile, como no resto da América Latina, uma das
coisas que mais caracterizou a presença salesiana foi a devoção a Maria Auxiliadora,
como demonstram as numerosas capelas que foram a ela dedicadas. Os salesianos
têm hoje quatro templos paroquiais e quatro igrejas públicas dedicadas a Maria
Auxiliadora.
2.5 Paraguai
Foi em 1879 que Dom Bosco respondeu ao pedido do cardeal
Nina, protetor da Congregação, prometendo enviar alguns salesianos a Assunção
para ajudar na formação do clero local. O padre João Allavena foi prestar
seu ministério sacerdotal durante a Semana Santa e permaneceu por dois meses
no Paraguai. Todavia, não foi possível cumprir logo a palavra dada. Com efeito,
os lazaristas foram ao Paraguai em 1889 e os salesianos, nesse meio tempo,
tomaram o lugar deles na Patagônia.
Doze anos depois, outro missionário salesiano, padre Ângelo
Savio, chegou a Assunção. Subiu o rio até Bahía Negra, na fronteira com o
Brasil. Teve um primeiro contato com os índios do Chaco e, voltando a Buenos
Aires, levou consigo algumas cartas para o superior salesiano e para a Congregação
Romana de Propaganda Fide, pedindo missionários para o Paraguai.
Em novembro de 1892, o cônsul do Paraguai em Montevidéu,
Matias Alonso Criado, escreveu à Santa Sé encarecendo as necessidades da infância
e da juventude no Paraguai e o estado deplorável dos índios do Chaco paraguaio.
O cardeal Rampolla transmitiu ao padre Rua o desejo do Santo Padre de interessar
o superior dos salesianos em estudar a possibilidade de fundar uma Missão
no Chaco e uma escola de Artes e Ofícios em Assunção. Viajando para a Itália
a fim de participar do Capítulo Geral, o padre Lasagna foi a Roma e, depois
de ser feito bispo titular de Oca-Trípoli, voltou para a América. Chegando,
um ano depois, a Assunção no Paraguai, conquistou de imediato o coração de
todos.
Após a morte de dom Lasagna, foi nomeado diretor do novo
colégio de Assunção o padre Ambrósio Turriccia. Os novos missionários partiram
de Montevidéu em 14 de julho de 1896. Em 1900 foi fundada em Concepción uma
segunda casa, cidade que constituía como que uma porta para as missões do
Chaco. No mesmo ano, no então distante subúrbio de Vista Alegre, começou com
uma pequena casa e uma capela dedicada ao Sagrado Coração que é hoje o Salesiano.
Mas em 1902 os choques entre o diretor e o governo fizeram
com que este ordenasse o fechamento do Colégio de Assunção. Como os edifícios
haviam sido doados aos salesianos por uma lei do Parlamento, criou-se um conflito
institucional entre o órgão legislativo e o poder executivo. Após muitas tratativas
chegou-se a uma solução. O padre Turriccia foi enviado ao Chile. Os salesianos
mudaram-se para uma nova sede, onde se encontram até hoje, o colégio foi reaberto
e o hospital passou às mãos do Governo.
Entretanto, desde 1919 iam-se criando residências missionárias
nos povoados do Chaco. Em 1924 foi aberta a escola agrícola de Ypacaraí. O
crescimento da presença salesiana foi tal que em 1954 o Paraguai teve uma
inspetoria própria.
Foi o padre Domingos Queirolo que deu à devoção a Maria
Auxiliadora uma verdadeira dimensão popular na nação guarani. Distinguiu-se
na construção de igrejas e capelas dedicadas à Virgem de Dom Bosco e deu ressonância
social à festa de Maria Auxiliadora com a publicação do semanário El mensajero
de Maria Auxiliadora. Superior das missões salesianas do Chaco, fez de
Maria Auxiliadora sua titular.
Os anos 1932-1935 não foram um período fácil. A guerra do
Chaco dizimou a população masculina do Paraguai. Vários colégios salesianos
foram transformados em hospital. padre Queirolo, padre Ernesto Pérez e outros
capelães salesianos infundiram nos soldados e no povo paraguaio plena confiança
na proteção de Maria Auxiliadora, que foi proclamada protetora e patrona do
exército paraguaio. A devoção à Virgem Auxiliadora radicou-se profundamente
no coração dos paraguaios.
Outro nome que merece lembrado é o do padre Guido Coronel,
que construiu os grandes templos de Coronel Oviedo e do Alto Paraná em honra
de Maria Auxiliadora e conseguiu fosse proclamada patrona do agro do Alto
Paraná.
Com igual interesse e zelo, as FMA se empenhavam na difusão
da devoção à Auxiliadora nas casas e no mundo feminino da nação.
3. A PRESENÇA SALESIANA
A presença salesiana na Região Cone Sul brotou de um sonho
de Dom Bosco e de sua própria paixão missionária. Foi assim que o carisma
se arraigou profundamente na América Latina, a ponto de tornar-se parte de
sua cultura. Comprova-o o crescimento prodigioso, que hoje faz da Congregação
Salesiana a força religiosa maior do continente.
De fato, após cento e trinta anos, a presença salesiana,
entre a América do Norte e a América Latina, compreende 26 inspetorias e 2
visitadorias em 23 nações, do Canadá à Argentina e ao Chile. Na Região do
Cone Sul são 14 as inspetorias: 5 na Argentina, 6 no Brasil, uma no Uruguai,
uma no Chile, uma no Paraguai. Para uma melhor coordenação, a Região divide-se
em duas conferências inspetoriais. A CISUR compreende as inspetorias de língua
espanhola: Buenos Aires, Bahía Blanca, Córdoba, La Plata, Rosario na Argentina,
e as inspetorias do Chile, Paraguai e Uruguai. A CISBRASIL compreende as inspetorias
de língua portuguesa de Belo Horizonte, Campo Grande, Manaus, Porto Alegre,
Recife e São Paulo.
Hoje há na Região 1.788 salesianos e 96 noviços, distribuídos
em 312 presenças. Deve-se observar, todavia, que, não obstante ser acentuadamente
juvenil a população dessas nações, o húmus religioso e católico da sociedade,
um número não indiferente de vocações e de irmãos na formação inicial, nota-se
igualmente uma persistente e progressiva queda numérica dos salesianos na
Região.
Constatando a diminuição de salesianos, mas também procurando
atingir uma qualidade melhor na formação, as inspetorias começaram a promover
uma colaboração interinspetorial e a planejar e levar adiante um processo
de redimensionamento. Com efeito, algumas obras já não têm uma comunidade
religiosa, mas são inteiramente geridas por leigos. Em outras inspetorias,
ao invés, apesar da ligeira flexão do número de obras, as frentes pastorais
se multiplicaram.
3.1 A vida religiosa
No que respeita à vida religiosa, deve-se reconhecer a substancial
fidelidade da maioria dos irmãos, que vivem com alegria, convicção e serenidade
a sua vocação religiosa, o empenho no serviço pastoral e educativo, a vida
fraterna, a fidelidade aos votos, a vida de oração e de formação contínua.
Por um lado é digna de nota a generosidade com que numerosos
irmãos, mesmo de idade avançada, assumem encargos de trabalho nos colégios
e nas paróquias, mas, por outro lado, deve-se registrar também o limitado
número de irmãos capacitados a assumir responsabilidades significativas no
papel de diretores, ecônomos, párocos. Em muitas obras, o diretor tem de assumir
também a responsabilidade da administração e isso pode prejudicar sua missão
de guia espiritual dos irmãos e de animador carismático da missão. A desproporção
entre obras e salesianos e a diminuição de irmãos leva muitas vezes a um acúmulo
de responsabilidades, que influi negativamente na vida da obra e na qualidade
de serviço, com um conseqüente estilo de individualismo pastoral.
Vocação e vocações
Não faltam na Região recursos vocacionais. A idade média
da população desses países, o húmus religioso, o substrato católico e cultural
e também a pobreza de grandes faixas do povo são elementos que concorrem para
o fato de a vocação à vida consagrada ou sacerdotal ter ainda grande acolhida.
Não há absolutamente comparação com o que está acontecendo na maior parte
dos países da Europa ocidental, onde semelhante proposta não encontra repercussão
em grande parte dos jovens, antes muitas vezes recebe uma recusa. Por um lado,
pois, é bonito notar como, na Argentina, Uruguai, Brasil, Chile e Paraguai,
a juventude seja ainda numerosa, generosa e aberta aos valores cristãos. É
assim que todos os anos muitos jovens iniciam seu percursos formativo com
generosidade e entusiasmo por Dom Bosco e pela missão salesiana. Por outro
lado, elemento crítico é o fato de tais candidatos, muitas vezes infelizmente,
revelarem motivações vocacionais fracas, uma base humana precária e uma formação
cristã pouco assimilada.
Verifica-se assim o fato de que, embora sejam numerosos
os jovens que freqüentam as nossas obras, os que se acham envolvidos nas diversas
formas de associacionismo do Movimento Juvenil Salesiano ou os que manifestam
disponibilidade pela proposta vocacional salesiana explícita, nos últimos
anos se verifique uma persistente diminuição das vocações. As inspetorias
que mais sofrem essa diminuição são as da Argentina e do Uruguai. No Brasil,
pelo contrário, vive-se atualmente um período de recuperação vocacional, que
merece ser estudado, justamente para conhecer-lhe melhor as causas. O Chile,
em geral, caracterizou-se por um marcado e fecundo trabalho nesse campo. E
o Paraguai está recolhendo os frutos do seu empenho na pastoral juvenil e
vocacional.
Os salesianos estão conscientes e preocupados pela diminuição
do pessoal e procuram descobrir suas causas e os possíveis caminhos de solução.
Em particular, procura-se projetar uma pastoral juvenil que leve à maturação
de projetos de vida, e uma pastoral vocacional propositiva, com experiências
de voluntariado social e missionário, um acompanhamento cuidadoso, um empenho
de vida sacramental e um sério caminho de discernimento.
3.2 Vida fraterna das comunidades
Tanto os Capítulos Inspetoriais celebrados um ano faz, como
as Visitas de Conjunto das duas conferências inspetoriais da Região revelaram
que as idéias-força do CG25, A Comunidade Salesiana Hoje, foram quadro
de referência e reflexão particularmente adequado para melhorar a vida das
comunidades. Ainda que com empenho e sucesso diversos, as comunidades assumiram
as cinco fichas do Capítulo Geral, procurando realizar o modelo de comunidade
querido por Dom Bosco e expresso no trinômio: Vivere in unum, in unum spiritum,
in unum agendi finem. Pretendeu-se destarte superar o falso dilema “vida
comum ou vida fraterna”, com a recuperação da intuição fundamental: a nossa
é uma “vida fraterna comum”. Evitou-se, dessa forma, ceder à tentação de considerar
como valor supremo o estar juntos, muito embora não exista algumas vezes um
relacionamento interpessoal profundo, ou à do “querer-nos bem”, mesmo que
não se verifiquem concretamente as condições para estar juntos.
Tudo isso levou a uma melhora do Dia da Comunidade, do funcionamento
dos Conselhos das obras, da Assembléia da Comunidade, do papel da CEP, como
núcleo animador. A propósito deste último elemento, a valorização da CEP nas
presenças resulta sempre maior, mesmo que o caminho seja ainda longo antes
que ela se torne fermento capaz de dar dinamicidade e de transformar toda
a obra.
Os objetivos escolhidos pelo Reitor-Mor com o seu Conselho
para a programação do sexênio 2002-2008 foram assumidos pela maior parte das
inspetorias e de fato figuram nos seus planos anuais. Há ainda atividades
que demonstram a realização de tais objetivos. O apelo a tornar mais significativas
as comunidades, quer sob o perfil da quantidade dos irmãos quer sob o da qualidade,
encontrou resposta no esforço feito por numerosas Inspetorias para reforçar
o número dos Irmãos de cada comunidade e no de promover um ritmo de vida que
favoreça a formação permanente e a significatividade pastoral. Em alguns casos
diminuiu-se o número das obras. Algumas delas foram confiadas aos leigos e
a vantagem foi que os irmãos puderam dedicar-se mais diretamente à sua missão
específica.
Não obstante tais esforços, continua grande a desproporção
entre empenhos apostólicos, campos de trabalho, complexidade das obras e o
número de irmãos. O perigo é o de pôr em risco a identidade da nossa presença,
a qualidade da proposta educativo-pastoral, a legibilidade do nosso testemunho,
a fecundidade espiritual e vocacional. É necessário, pois, encontrar e manter
o equilíbrio entre a nossa sensibilidade pastoral, que nos levaria a ir ao
encontro de todas as necessidades dos jovens, especialmente os mais pobres,
e a convicção de que não somos chamados, e sobretudo não nos é possível, resolver
todos os problemas sociais e pastorais.
3.3 Missão salesiana
A missão salesiana, sabemos, não se identifica com as obras
ou as atividades, e nem se reduz a elas. É antes de tudo a paixão de Dom Bosco
pelo bem das almas, dos jovens! Tarefa da pastoral juvenil é, pois, manter
este zelo missionário e torná-lo sintomático, orgânico, operativo.
Em nível da Região América Cone Sul, em 1985 foi criado
o Secretariado de Pastoral Juvenil de Plata (SECPLA), que se transformou em
SEPSUR com a integração da Inspetoria Chilena, e demonstrou vitalidade, organização
e eficácia operativa. Demonstram-no as consultas, os cursos de atualização,
os seminários de trabalho para preparar material pastoral, o Quaderno de
PJ, os encontros especiais com os animadores das obras e do território,
os encontros com os jovens.
Na Conferência Inspetorial Brasileira essa tarefa foi confiada
à Articulação da Juventude Salesiana (AJS), que coordena todo o associacionismo
juvenil. Trata-se de uma equipe nacional de referência que funcionou bem e
também produziu interessantes subsídios, como os Cadernos Salesianos,
que se mostraram muito úteis para os animadores locais. Atualmente essa equipe
nacional compreende também as FMA. Essa integração, válida em si, não escapou
de problemas por causa da diversidade do caminho percorrido pelas duas Congregações,
do modo diverso de conceber o trabalho com a juventude e da dificuldade de
manter um grupo estável. Ressalto, porém, o valor grande de acreditar nessa
colaboração e de querer de qualquer forma criar sinergia.
Criou-se também uma equipe de reflexão da CISBRASIL, para
coordenar o âmbito da juventude e para responder às interrogações de coordenadores,
animadores e agentes de pastoral. Anualmente se faz um Encontro com todos
os delegados inspetoriais de Pastoral Juvenil. Entre os dados emergentes,
por uma parte pelo que diz respeito aos jovens, se nota um aumento de jovens
voluntários disponíveis para trabalhar nas missões, por outra parte, no que
tange aos Irmãos, constata-se uma diminuição do número de salesianos disponíveis
para acompanhar os jovens, especialmente para um caminho de fé.
Setor Escola
Na Região, o Setor Escola continua um dos serviços mais
consistentes e significativos. Nestes últimos anos, apesar da diminuição do
número de salesianos, houve um aumento das obras de educação formal, especialmente
das de nível superior (IUS). Todas as inspetorias do Brasil, da Argentina
e do Chile contam diversas escolas de nível superior. Falaremos disso mais
à frente.
Talvez a coisa mais digna de ser sublinhada no campo da
educação formal na CISBRASIL seja a criação da rede de ligação entre as várias
escolas. Tudo isso em colaboração com as Inspetorias das FMA. A finalidade
principal é garantir a identidade salesiana das nossas escolas, formar os
professores na pedagogia salesiana e elaborar textos escolares segundo uma
linha pedagógica salesiana, sobretudo para as escolas convencionadas. Dever-se-ia
aqui lembrar que, no que respeita à produção de textos escolares, a Argentina
e o Chile exercem há anos essa atividade, em colaboração societária com a
editora salesiana Edebê de Barcelona, Espanha.
Do ponto de vista do financiamento, a situação das escolas
se apresenta muito variada. Enquanto as escolas salesianas do Chile são totalmente
financiadas pelo governo e as da Argentina têm o apoio do Estado, pelo que
os pais dos alunos pagam uma cota acessível, as do Brasil, do Paraguai e do
Uruguai não recebem nenhum tipo de subsídio. São assim apenadas as famílias
que, não tendo particulares possibilidades econômicas, continuam privadas
da possibilidade de escolher para os próprios filhos uma escola de qualidade
e dotada de um preciso projeto educativo.
Escolas agrícolas e centros de formação profissional
Uma das presenças que tiveram grande sucesso nos países
da Região Cone Sul foram as escolas agrícolas. Ainda que em número mais reduzido
do que no passado, as Inspetorias da Argentina, Uruguai, Chile e Paraguai
têm ainda escolas agrícolas, que são reconhecidas pela sua qualidade. Ao invés,
parece um pouco paradoxal que, numa nação acentuadamente agrícola como o Brasil,
as escolas agrícolas não sejam tomadas em consideração pelos jovens e suas
famílias. Aconteceu então que, com o fechamento dos internatos, tais escolas
no Brasil foram todas fechadas.
Ao contrário, multiplicaram-se os centros de formação profissional,
também porque diversas organizações, sobretudo européias, os favoreceram muito
com meios e subsídios econômicos. Hoje, como nos tempos de Dom Bosco, muitos
adolescentes ou jovens têm necessidade de trabalhar para ajudar economicamente
suas famílias, e nas escolas profissionais encontram a possibilidade de uma
formação necessária para inserir-se ativa e profissionalmente no mundo do
trabalho. Pessoalmente sou do parecer que este campo da nossa presença deve
ser firmemente promovido e apoiado. Coloca-nos em contato com os jovens mais
pobres e nos permite uma ligação com o mundo do trabalho. E isso é tanto mais
significativo neste momento em que o modelo cultural tende a evidenciar o
primado dos estudos superiores e universitários que dão uma certa imagem e
um particular status social. Além disso, estou convencido de que o trabalho
dos nossos centros profissionais pode oferecer uma contribuição preciosa a
esses países que se encontram ainda em processo de desenvolvimento industrial.
Setor Marginalização
Um dos setores em que a Região Cone Sul se moveu com mais
coragem e eficácia foi no da marginalização. A presença salesiana junto aos
menores em dificuldade se encontra hoje entre as mais significativas, não
só porque é uma obra que nos permite trabalhar em favor dos meninos mais necessitados,
mas também porque nos dá a oportunidade de estar em contato constante com
os organismos governativos e administrativos que coordenam as políticas sociais.
Trata-se também de uma estratégia importante para influir na mudança de mentalidade
dos governantes, tendo em conta que são eles que têm a possibilidade de mudar
ou pelo menos melhorar em parte a situação social e cultural de tantos meninos
pobres e em situação de grave risco pessoal e social. Hoje encontramos, felizmente,
vários irmãos e membros da Família Salesiana presentes nos organismos em que
se discutem as políticas sociais para os meninos e os adolescentes.
Inspirado na experiência do padre Javier de Nicol