“PERTO OU LONGE, EU PENSO SEMPRE EM VÓS”
1. Um canto de louvor – 2. Primeiros meses de trabalho no Conselho Geral – 3. A atividade de orientação doutrinal – 4. Visita às inspetorias – 4.1 Na Itália – 4.2 Na França – 4.3 Na Polônia – 4.4 Na Argentina – 4.5 Nas Filipinas e na Tailândia – 5. Conclusão.
Atos do conselo geral 381
Roma, 25 de março de 2003.
Solenidade da Anunciação do Senhor
“perto ou longe, eu penso sempre em vós” [1].
Começo esta carta fazendo minhas as palavras do nosso querido pai Dom
Bosco, primeiro porque partilho com ele os mesmos sentimentos para convosco,
e também porque esta carta tem uma natureza particular. Como vereis,
é menos doutrinal e mais familiar. Fala da vida da Congregação, assim
como a estou encontrando nas visitas às inspetorias, e propõe algumas
reflexões que nascem dos reclamos da realidade e dos seus desafios.
Com isso entendo também satisfazer um pedido do CG25 que, falando das
Cartas circulares do Reitor-Mor, dizia: “para melhor valorizá-las nas
várias comunidades, sugere-se que sejam escritas numa linguagem simples
e discursiva e que se alternem as ricas de conteúdo sobre temas compromissivos
com outras familiares e informais sobre a vida da Congregação” (CG25,
101). Procurarei ser fiel a esse pedido, a fim de ajudar a desenvolver
mais o sentido de Congregação e estimular a refletir sobre o carisma,
duas coisas indispensáveis para garantir a unidade na diversidade, tarefa
das mais preciosas que me cabe executar. Assim, a comunicação do Reitor-Mor
será posta a serviço da animação e do governo, partindo do que se fez
ou se está fazendo na Congregação e das suas necessidades e dos seus
desafios.
Depois da Carta sobre a santidade, que foi acolhida como um texto programático
e despertou em muitos irmãos e comunidades o desejo de trabalhar mais
seriamente para esta nossa vocação fundamental, publicamos o “Projeto
de animação e governo do Reitor-Mor e do seu Conselho para o sexênio
2002-2008”. Todos os conselheiros o estão apresentando nas diversas
inspetorias, procurando colocá-las em sintonia com as grandes linhas
prioritárias. Chegou, pois, o momento de partilhar convosco as minhas
impressões e avaliações deste já primeiro ano de reitorado. Falei disso,
depois de minhas viagens, nas “boas noites” dadas na Casa Geral e no
encontro com os irmãos da Visitadoria da UPS nos primeiros dias de dezembro
de 2002. Penso, porém, que vale a pena recolher de forma mais sistemática
esse conteúdo e torná-lo conhecido a toda a Congregação.
1. UM CANTO DE LOUVOR
O primeiro pensamento que julgo dever expressar é o de dar graças
a Deus, do fundo do coração, pelo crescimento do carisma de Dom
Bosco a serviço dos jovens nos mais diversos contextos e condições.
Estamos em contextos de elevado bem-estar, de sociedades desenvolvidas,
de tecnologia avançada, e em outros, ao contrário, de extrema pobreza,
de subdesenvolvimento, de técnica atrasada; contextos de democracias
consolidadas, nos quais se pode praticamente fazer tudo no campo da
missão, e outros de regimes totalitários, nos quais se faz o que se
pode; contextos de população de maioria cristã e católica, e outros
em que o número dos católicos não chega sequer a um por cento, mas onde
o nosso trabalho educativo é muito significativo do ponto de vista cultural,
à maneira de um fermento capaz de levedar a cultura do país. Presenças
de rica tradição salesiana e outras em que se sente mais a distância
das origens da Congregação.
Este agradecimento se estende aos irmãos missionários, os da primeira
hora enviados por Dom Bosco e os da segunda, terceira ou quarta hora,
enviados pelos seus sucessores. Eles desempenharam e continuam a desempenhar
um papel imprescindível, como é o da implantação do carisma salesiano,
que é essencialmente educativo- pastoral em favor dos meninos, especialmente
os mais pobres, abandonados e em situação de risco psicossocial. Desse
ponto de vista, é preciso lembrar que somos herdeiros e transmissores
de um carisma, de um espírito, de uma espiritualidade, de uma missão,
e não simplesmente operadores diocesanos ou agentes sociais, ainda que
muito empenhados no campo da construção da igreja local e da promoção
humana. Essa afirmação não significa que nós salesianos somos um grupo
fechado. Jamais! Como religiosos, somos homens de Igreja. Como apóstolos,
estamos profundamente inseridos na história humana.
O nosso tipo de presença é, porém, orientado a levar à Igreja e à sociedade
a contribuição específica dada por Dom Bosco. Os critérios de avaliação
de um bom êxito do carisma são o aumento do número de presenças, onde
é possível, fruto do dinamismo interno que leva a expandir-se, o crescimento
qualitativo e quantitativo das vocações, o desenvolvimento da Família
Salesiana, a relevância evangélica social e eclesial, a vida de santidade.
Isso se pode constatar, graças a Deus, aqui e ali. Os missionários e
a missionariedade são, pois, dois elementos necessários do carisma que
devem ser cuidados e promovidos em cada uma das inspetorias.
O meu agradecimento dirige-se naturalmente a todos vós, queridos irmãos,
pelo dom da vossa vida ao Senhor na casa e na escola de Dom Bosco. A
maior riqueza da Congregação não são as estruturas, por maiores e mais
fascinantes que possam ser ou parecer, mas os seus membros. É importante
envolver colaboradores na gestão das nossas obras, fazer crescer a Família
Salesiana, procurar pessoas sempre mais identificadas com a nossa proposta
educativo-pastoral. Todavia o bem mais precioso que a Congregação possui
é a vida de cada um dos irmãos, seja o que exerce cargos de animação
ou governo, seja o que trabalha em serviços pouco vistosos, o jovem
e pleno de energias, como o idoso e talvez doente. Devemos ser muito
gratos a todos os irmãos. Sem eles a Congregação poderá ter muitos amigos
de Dom Bosco, mas não salesianos. Isso nos faz pensar, sim, no cuidado
das vocações, mas também no acompanhamento de cada um dos professos.
O irmão não é alguém que partilha casa ou trabalho, mas “alguém que
me pertence”, “um dom do Senhor” (NMI 43), com o qual é preciso criar
comunhão e comunidade, pois “Deus nos chama a viver em comunidade, confiando-nos
irmãos para amar” (Const. 50). Sobre este tema o CG25 e a estréia 2003
tornam-se um estímulo e um programa. Estou certo que as inspetorias
saberão explorá-los para a renovação das comunidades.
Este canto de louvor faz-me pensar, em particular, no nosso centro de
referência, Dom Bosco, que deve sempre ser estudado e imitado, como
nos propõe o artigo 21 da nossa Regra de Vida. Trata-se de conhecer
a fundo sua vida, sua história, seu projeto apostólico, tal como aparece
nas Constituições e no desenvolvimento da Congregação através dos Capítulos
Gerais, especialmente os dos últimos trinta anos. Trata-se de caminhar
no mesmo ritmo, em sintonia de sensibilidade e de opções, embora em
circunstâncias muito diversas.
Visitando as inspetorias, dou-me conta de que as que se esforçaram por
assumir os Capítulos Gerais e as grandes propostas levadas adiante pelo
Reitor-Mor com o seu Conselho nos campos da formação, da pastoral juvenil,
da Família Salesiana, da comunicação social, das missões, da economia,
se sentem mais inseridas no movimento da Congregação. Basta pensar no
cuidado de algumas inspetorias em traduzir os documentos mais importantes,
para torná-los acessíveis a todos os irmãos.
Não falta, porém, algum caso de resistência à mudança, como se se tratasse
de algo facultativo, com o risco de isolar os irmãos individualmente
e toda a inspetoria. Sob este perfil considero que uma das tarefas não
delegáveis dos superiores das circunscrições jurídicas (inspetorias,
visitadorias, delegações) é o de garantir a identidade e criar sentido
de Congregação. Estou consciente de que os mais próximos ao centro têm
mais possibilidades, também de meios, e que os mais distantes são muitas
vezes os que têm mais dificuldades. Por isso aprecio muito quanto se
faz nesse sentido e fico reconhecido.
2. PRIMEIROS MESES DE TRABALHO NO CONSELHO GERAL
Dizia no começo que já são passados onze meses desde o momento em que
fui eleito Reitor-Mor. Talvez queirais saber o que fiz nesse período.
Digo logo que o trabalho mais forte nesses primeiros meses foi feito
em nível do Conselho Geral, como é normal, também porque fiz desde o
início a opção de trabalhar muito mais colegialmente. O que significa
que, em temas que de hábito não eram tão examinados ou estudados em
nível de Conselho – porque se julgava que estava bem assim –, houve
de minha parte a opção de envolver muito mais cada um dos conselheiros.
• Um exemplo desse envolvimento diz respeito à reflexão sobre a relação
do Reitor-Mor e do Conselho Geral com a UPS. Sobre esse ponto fizemos
um primeiro estudo, tanto em nível institucional como em nível operativo.
Tivemos sempre em mente três grandes elementos: a identidade da UPS
e a sua especificidade; o projeto orgânico da nossa Universidade, com
um empenho sério na escolha do pessoal para as diversas faculdades;
e, enfim, a reestruturação edilícia, já realizada em parte com as novas
residências para as comunidades de estudantes, a nova biblioteca, a
renovação de algumas áreas, e que deverá ser levada adiante no futuro
com a nova sede para a Faculdade de Ciências da Comunicação Social e
adequação às normas da segurança.
Fizemos também uma avaliação institucional da Universidade, começando
pela Faculdade de Letras Cristãs e Clássicas, e levamos a termo uma
das orientações da última visita de conjunto, relativa à unificação
numa única pessoa do ecônomo da Visitadoria e do ecônomo da Universidade.
Justamente porque a UPS é a Universidade da Congregação, aproveito a
ocasião para agradecer à Universidade e à Visitadoria o serviço tão
apreciado que prestaram ao longo de todos estes anos. Também agradeço
a todos os professores que contribuíram com seu trabalho intelectual
e profissional para formar os quadros das inspetorias e dioceses e fazer
com que a nossa Universidade viesse a ocupar o lugar que tem hoje entre
as Universidades Pontifícias. Quereria fazer sentir esta nossa Universidade
como uma realidade que pertence a todos nós, e por isso convido a ser
muito abertos e generosos na colaboração para o pessoal. Até poucos
anos atrás, os Reitores-Mores sabiam que podiam facilmente encontrá-lo
nas inspetorias da Itália que, nesta área específica como em outras,
foram sempre muito generosas e solidárias. Chegou o tempo em que o caráter
pluricultural da Congregação e da própria Universidade, além da falta
de pessoal na Itália, obriga a ser co-responsáveis por levar adiante
a nossa Universidade com qualidade e competência. O empenho de renovação
da nossa Universidade exige também o envolvimento da Congregação na
valorização desta nossa benemérita instituição com o envio de irmãos
de todas as regiões da Congregação para a sua qualificação.
• Além da administração ordinária, no Conselho especial foi dada atenção
nestes meses à nomeação dos inspetores. Já nomeamos, neste período,
quase trinta inspetores. Sabeis que são 95 os inspetores na Congregação,
quer dizer que praticamente nomeamos uma terça parte. Influiu talvez
para tão grande número de nomeações em período tão breve também a doença
do padre Vecchi, no final do último ano. Com efeito, embora tivessem
sido feitas consultas em várias inspetorias, o Conselho Geral precedente
tomou naquele momento a decisão de procrastinar a nomeação até que se
tivesse um novo Reitor-Mor, conscientes de que se trata de uma tarefa
muito específica do Reitor-Mor. A nomeação do inspetor cria uma relação
de todo particular entre o Reitor-Mor e o inspetor ao qual é confiada
uma inspetoria ou uma visitadoria.
• Todavia, mais trabalhosa e diria até mais importante nesse período
foi a elaboração do Projeto de animação e governo do Reitor-Mor
e do seu Conselho. Foram vários meses de trabalho: quis-se envolver,
com efeito, os diversos Dicastérios dentro da Casa Geral e, em nível
de Congregação, as Regiões e os inspetores. Foi uma experiência muito
proveitosa. Não quero repetir aqui o que escrevi na apresentação do
Projeto no número 380 dos ACG. Convido-vos antes a lê-la e a conhecer
bem o Projeto da Congregação para esses seis anos. É bom – antes, necessário!
– saber para onde estamos caminhando, com que opções prioritárias, quais
metas atingir, quais estratégias empregar, qual tipo de intervenções.
Congratulo-me com as inspetorias que fizeram a própria programação tendo
presente o Documento do CG25 bem como o nosso Projeto histórico. Espero
que as inspetorias que não o fizeram se sintam estimuladas.
• Outros temas ocuparam a nossa atenção e o nosso tempo. Além de quanto
lembrei a respeito da UPS, iniciamos também o estudo da valorização
de Cremisan. Levamos em consideração o presente e o futuro imediato,
deixando para outro momento mais favorável uma perspectiva de longo
prazo, já conjeturada pelo padre Vecchi. Sabemos todos quão incerta
é a situação política na Terra Santa. Decidimos robustecer a comunidade
formativa e o centro de estudo de Cremisan, tornando-os sempre mais
internacionais. Cremisan é uma proposta formativa para as oito Regiões
da Congregação, como o é a comunidade para teólogos do Gerini em Roma.
Num mundo pluricultural e globalizado reconhecemos a importância de
experiências de internacionalidade e de interculturalidade, a partir
dos estudos teológicos. Visamos também iniciar nos próximos anos o uso
da língua inglesa.
• Concluímos e aprovamos os documentos sobre a identidade das Instituições
Universitárias Salesianas (IUS), e sobre a política da Congregação
a esse respeito. Termina assim um período extraordinário, com uma delegação
pessoal dependente diretamente do Reitor-Mor, que teve como escopo o
levantamento de dados sobre nossas Universidades e Institutos de educação
superior. Esse período mostrou-se muito enriquecedor, porque nos permitiu
conhecer melhor uma realidade existente na Congregação, e porque atingiu
um nível exemplar de coordenação e de sinergia. Começa agora uma nova
fase, mais institucional, com a inserção deste setor no Dicastério da
Pastoral Juvenil, com um projeto e uma programação bem definidos, a
fim de garantir sempre melhor as condições que tornem significativas
estas presenças e usufruir mais de sua contribuição. A Congregação não
pretende levar todas inspetorias a ter a própria Universidade, mas quer
fazer-se responsável por tais instituições, estabelecendo com clareza
sua identidade e definindo os critérios que a tornem possível. Estes
serão de fato tomados em consideração como quadro de referência, quando
houver o pedido de ereção de uma nova Universidade.
• Estudamos e definimos a política administrativa e financeira,
tratando-se de um elemento importante, não somente para o bom funcionamento
da economia, mas também para sua adequação à criteriologia salesiana.
Além da previsão orçamentária (budget) para 2003, aprovada pelo
Reitor-Mor com o seu Conselho, estudou-se também o balanço de 2001.
A propósito, muitas inspetorias estão caminhando sempre mais sobre esta
mesma linha, tanto em nível provincial como local. Outras, ao invés,
têm ainda caminho pela frente para superar o risco, não irreal, da falta
de uma administração profissional e salesiana.
• Na mesma linha, muito embora o argumento se refira mais freqüentemente
ao Dicastério das Missões, definimos os critérios para a distribuição
de fundos, tendo presente que a Congregação, ano após ano, através
das procuradorias missionárias, distribui uma soma consistente, para
levar adiante o trabalho que fazem as inspetorias nos diversos contextos,
especialmente os mais necessitados de subsídio e de solidariedade. Foi
enviado aos inspetores um comunicado, que os irmãos devem conhecer,
seja pelo que se refere aos pedidos de ajuda, seja pelo que diz respeito
à prestação de contas. Maior responsabilidade no uso do dinheiro e a
prestação de contas dele é um dever moral em relação aos benfeitores
e os diretores das grandes Procuradorias – Bonn, Madri, New Rochelle,
Turim – que assim poderão também informar os próprios benfeitores.
• Tivemos, além disso, um primeiro contato com o esboço para a avaliação
dos Capítulos Gerais, pedido pelo CG25, n. 136. Na assembléia
capitular sentiu-se a urgência de rever o modelo com que se desenvolveram
os últimos Capítulos Gerais do CG23 ao CG25. Eles continuaram a utilizar
um modelo que se mostrou válido para os Capítulos Gerais extraordinários
– 19, 20, 21 e 22 – que tinham como escopo a redefinição da identidade
da Congregação e que se considerou concluída com a aprovação do atual
texto constitucional. Os Capítulos seguintes tiveram um tema sobre o
qual refletir. Os capitulares fizeram sentir a necessidade de tomar
como ponto de partida a Relação que é apresentada sobre o estado da
Congregação, para especificar juntos as grandes opções a serem tomadas,
as grandes áreas a serem priorizadas, confiando posteriormente ao Reitor-Mor
e ao seu Conselho a tarefa de traduzi-las operativamente num projeto
de animação e governo. No âmbito do Conselho Geral se continuará a reflexão,
para depois comunicar às inspetorias o resultado da avaliação e eventuais
propostas, sabendo que tais propostas deverão ser feitas não além da
metade do sexênio.
• Outros temas de estudo focalizaram a necessidade de renovar
o portal internet da Congregação, procurando torná-lo mais completo,
ágil e interativo; subsídios para os diversos projetos pedidos pelo
CG25: o projeto orgânico inspetorial, o projeto pessoal de vida
e o projeto de vida comunitária; Don Bosco International (DBI),
o escritório fundado há anos e que quer desempenhar o papel de rosto
civil da Congregação diante das instituições da Comunidade Européia
para tudo quanto diz respeito à juventude, e Don Bosco Network
que é a rede das procuradorias missionárias operantes sob a égide do
DBI; a atenção aos bens culturais da Congregação, pelo que se
pensa na coordenação de alguns dicastérios para cuidar das bibliotecas,
museus, arquivos, obras de arte, produção de comunicação social; a
atualização do Vademecum do Conselho Geral, que recolhe a codificação
das Constituições e Regulamentos sobre as diversas tarefas do Reitor-Mor
e do Conselho e ao mesmo tempo as sugestões que vêm da experiência,
a sondagem feita em toda a Congregação sobre a conveniência de um lugar
comum; enfim, o tema da comunidade da Casa Geral.
Como estais vendo, dedicamos grande parte do trabalho do Conselho ao
estudo. É este um elemento que não se deve subestimar, sobretudo porque
nos diz que a animação e o governo da Congregação, de uma inspetoria
e de uma comunidade, têm necessidade de reflexão, mas também porque
é imprescindível fixar as políticas de governo e definir os critérios
de identidade e de avaliação. Não foi um tempo perdido. Antes! Penso
que essa é uma tarefa que dá frutos a longo prazo, porque são os projetos
comuns, além do afeto para com cada irmão, que verdadeiramente ajudam
a criar comunhão e unidade.
3. A ATIVIDADE DE ORIENTAÇÃO DOUTRINAL
A segunda grande área do meu trabalho durante esse período situou-se
sem dúvida no campo da orientação doutrinal – espiritual, comunitária
e pastoral – que deve ser entendida sempre como um elemento de governo
e não como simples animação.
Nesse aspecto específico gostaria de retomar um elemento que o padre
Juan Vecchi, e já antes o padre Egídio Viganó, sublinhava muito. Quando
apareciam suas cartas, ele dizia explicitamente que elas não eram escritas
apenas para fazer delas uma leitura espiritual, mas para estudá-las,
torná-las parte da cultura salesiana, entendida não do ponto de vista
nocional, mas antes do ponto de vista da Gaudium et Spes, isto
é, como a maneira salesiana de ser, de reagir, de enfrentar a realidade,
de relacionar-se mutuamente.
Nesse período escrevi somente uma carta circular, a que tratou da santidade.
Redigi, outrossim, a apresentação do documento do CG25; elaborei o comentário
escrito da Estréia e uma sua apresentação em vídeo; redigi a introdução
ao projeto de animação e governo do Reitor-Mor e do Conselho Geral,
que apareceu no número anterior dos Atos do Conselho Geral. Evidentemente
houve também muitas outras intervenções: conferências, saudações, mensagens,
inclusive para o Boletim Salesiano, para a Família Salesiana
e para o Movimento Juvenil Salesiano, entrevistas para jornais, rádio,
televisões, que verdadeiramente exigem muito tempo e preparação. Agora
conheço de modo mais direto o ritmo de vida e o horário de trabalho
de Dom Bosco e dos meus predecessores, e a insistência de um deles que
dizia que o Reitor-Mor deve dedicar grande parte do tempo ao estudo,
para poder oferecer uma doutrina sólida, de modo que as mensagens que
escreve possam ser iluminadoras e propositivas, e não uma palavra meramente
formal e conseqüentemente pouco incisiva.
Vejo, de qualquer maneira, que os documentos salesianos não chegam oportunamente
a todas as inspetorias, ou pelo menos não a todas as comunidades, criando
uma situação um tanto singular: acontece, de fato, que enquanto um documento
não foi ainda lido, o Reitor-Mor já está escrevendo um outro. A solução
não é certamente a de deixar de escrever, porque o superior que presta
este serviço não escreve para a própria glória, mas para guiar e acompanhar
o curso da vida humana, eclesial e salesiana. Pode-se certamente fazer
uma pausa e não escrever, mas com isso não se detém a história, nem
se enfrentam os problemas, nem se ilumina a vida.
Penso que sobre este ponto todos, a começar pela Direção Geral, estamos
chamados a fazer um esforço para favorecer o acesso imediato às diversas
comunicações. Estamos procurando colocar os textos no nosso site, para
que sejam transmitidos diretamente pela internet. Cabe naturalmente
às inspetorias preocupar-se com a distribuição, o estudo e alguma vez
também com a avaliação, procurando sempre que sejam conhecidos e assumidos.
Nessa linha, um bom irmão da Casa Geral me sugeria que não escrevesse
uma nova carta, senão depois de ter feito uma avaliação da maneira como
tinha sido acolhida e tornada programa de vida a carta sobre a santidade.
Embora não tenha julgado oportuno assumir esta sugestão, a preocupação
permanece válida.
Por ora antecipo a intenção de orientar as cartas e outras comunicações
importantes durante o sexênio pelos objetivos do Projeto de animação
e governo e à luz do CG25. Será uma forma de aprofundar e iluminar a
práxis.
4. VISITAS ÀS INSPETORIAS
Não visitei ainda todas as inspetorias. Digo “ainda”, porque olhando
a agenda fico até um pouco assustado. Por um lado dou-me conta de que
a presença nas inspetorias torna-se um meio privilegiado de animação,
sobretudo quando as visitas são bem preparadas. Por outro lado estou
consciente de que não posso ficar muito tempo fora da Casa Geral, porque
devo atender a muitas outras responsabilidades. Ponho-me à vossa disposição
e peço a vossa compreensão se nem sempre o Reitor-Mor pode visitar todas
as inspetorias. Lembro que o vigário também desempenha esse papel em
muitos casos; além disso, há no Conselho a preocupação de que todas
as inspetorias possam ser visitadas pelos diversos conselheiros de setor,
além dos conselheiros regionais.
Na Europa visitei várias inspetorias da Itália: a Inspetoria Lombardo-Emiliana,
no início do meu mandato, e muito brevemente, por ocasião da festa do
Beato Artêmides Zatti em Boretto, pelo que deverei voltar ainda; o Piemonte
e o Valle d’Aosta, inspetoria que visito muitas vezes, pois nela se
encontra a casa-mãe e os lugares de referência das nossas origens; a
Lígure-Toscana, a Sardenha, a Inspetoria Romana, na qual participei
de muitos eventos, e a Vêneta. Visitei a França, a Espanha, em particular
Salamanca para a colação da cidadania, tendo estudado naquela Universidade,
a Polônia e a Albânia. Na América, estive no México, na Argentina e
no Brasil (Inspetoria de Recife). Na Ásia visitei as Filipinas e a
Tailândia. Não estive até agora em nenhum país da África nem da Oceânia.
Também a respeito dessas visitas, desejo partilhar convosco algumas
experiências, mas sobretudo alguma reflexão que fiz, ao entrar em contato
e conhecer algumas dessas inspetorias. Não falarei evidentemente de
todas.
4.1 Na Itália
Começo pela reflexão sobre a visita às inspetorias italianas. Elas têm
o privilégio de terem sido herdeiras diretas do carisma de Dom Bosco.
E verdadeiramente souberam acolhê-lo muito bem e também transmitir.
Em síntese, poderia dizer que a organização e a vida pessoal e comunitária
dessas inspetorias procura ser fiel à criteriologia salesiana presente
nas Constituições.
Quando se tem a visão de conjunto da Congregação que se acha presente
em cerca de 130 países do mundo, quando se tem a oportunidade de participar,
por exemplo, numa experiência como a do CG25, no qual a mundialidade
é verdadeiramente bem representada, damo-nos conta de que há uma identidade
dentro da diversidade cultural da nossa Congregação Salesiana. Isso
se deve atribuir, em grande medida, antes de tudo à capacidade de transmissão
fiel de um carisma, à sua implantação, ao seu arraigamento e à sua capacidade
de difusão nos diversos países e contextos em que se desenvolveu a Congregação.
Deve-se dizer que houve uma sábia política de governo no não concentrar
todos os salesianos italianos no mesmo país, no não multiplicar sem
medida as inspetorias na Itália, no trabalhar a missionariedade na Itália
e depois a mundialidade na Congregação.
Sob esse perfil, a atuação clarividente de Dom Bosco desde o início,
quando em 1875 enviou a primeira expedição missionária, revelou-se dinâmica,
corajosa e adivinhada. Com esse impulso continuou-se através dos anos,
e por vezes até com duas expedições missionárias anuais. Esta missionariedade
pode explicar a nossa difusão mundial, mas também a configuração atual
da Congregação, que tem uma presença, afinal, bem proporcionada nos
cinco continentes. É verdade que hoje não tem havido muitas vocações
na Itália, pelo menos não tão numerosas como no passado; é verdade que
a presença salesiana em países de antiga tradição cristã da Europa deverá
assumir uma nova configuração, mas é igualmente verdade que a nossa
Congregação continua a crescer em toda a Ásia, e não somente na Índia,
e na África, ao passo que na América Latina os números são mais ou menos
constantes.
Essa presença da Congregação no mundo é devida de modo especial, embora
não exclusivo, aos salesianos da Itália. Desde a primeira “boa noite”
quis agradecer aos salesianos italianos a transmissão fiel e dinâmica
do carisma. Nessa mesma ocasião evidenciei que essa tarefa passou hoje
para todos os salesianos, sobretudo pelo fato que a Congregação já não
é – ou somente – italiana, mas realmente mundial, e também pelo fato
que a responsabilidade deve agora passar às inspetorias nos diversos
contextos.
A missionariedade da presença salesiana italiana, que continua a ser
muito forte, desempenhou um papel importante também na inculturação
do carisma. Vós encontrareis os missionários italianos em algumas das
mais bem-sucedidas experiências de inculturação na Congregação, porque
estudaram a antropologia aplicada, procuraram penetrar a cultura dos
povos, aprenderam a língua, escreveram gramáticas e criaram dicionários,
promoveram e acompanharam seus processos. Seria miopia não valorizar
o que a presença salesiana italiana deu à Congregação: entre outras
coisas, um sentido muito forte de Congregação e exemplos válidos de
inculturação.
Mas que significa a afirmação que agora a tarefa da transmissão do carisma
deve passar a todas as inspetorias? Que cada inspetoria deve desenvolver
e cultivar esses elementos, e em primeiro lugar um profundo conhecimento
de Dom Bosco. Dom Bosco deve ser conhecido! Não se pode viver de “lugares
comuns” ou de episódios, sem descobrir onde se encontram critérios e
leis de vida salesiana. Deve-se estudar Dom Bosco! Há sem dúvida uma
transmissão vital do carisma, do espírito, da espiritualidade, da missão.
É uma espécie de hermenêutica existencial do que significa hoje ser
salesiano. Esta experiência deve ser, porém, codificada e ter um quadro
de referência. Em vista desse trabalho tão fundamental, houve na Itália
um investimento muito consistente de pessoal, no campo da história,
tanto a da biografia como a da historiografia crítica, no campo da pedagogia
e das ciências da educação, no campo da espiritualidade. Trata-se de
três elementos essenciais para um conhecimento aprofundado e uma transmissão
fiel do carisma. Portanto, a passagem da responsabilidade da transmissão
do carisma a todas as inspetorias do mundo não pode ser um slogan
privado de conteúdo; implica conseqüências. E essas conseqüências devem
ser explicitadas, justamente porque depois se deve verificar se realmente
as inspetorias são capazes de tomar nas mãos o testemunho.
Há um outro elemento muito importante: a santidade. Para ser
exatamente fiel, a transmissão de um carisma tem necessidade de testemunho,
de santidade. Penso que estamos todos conscientes de pertencermos a
uma família de santos, irmãos, membros da Família Salesiana, educandos
que atingiram uma medida elevada de vida espiritual. É muito bonito
visitar as inspetorias e descobrir esses modelos, próximos à realidade
de todos, a ponto de poder dizer: olhai o que conseguiram fazer esses
irmãos ou esses meninos e o que estamos chamados a fazer ou a ser nós
também.
4.2 Na França
Digo logo que tinha ido à França essencialmente para aprender um pouco
de francês, portanto não para fazer uma visita. No fim, porém, o objetivo
primário juntou-se a um programa de visitas às comunidades da Alsácia,
da Bretanha e Normandia. Foi uma experiência muito agradável, interessante
e enriquecedora.
Três elementos sobretudo me causaram impressão. Primeiramente um grande
amor a Dom Bosco. Sabemos que Dom Bosco foi à França em busca de fundos
para pagar as despesas da Igreja do Sagrado Coração, e sobre isso ele
foi muito explícito. A coisa mais bonita é que, além de alcançar a ajuda
que pedia, Dom Bosco tornou-se uma atração para o povo francês, que
ficou encantado com ele. Lendo alguns documentos da primeira visita
de Dom Bosco, percorrendo as páginas de algumas de suas falas nas igrejas,
vê-se como conseguiu suscitar e despertar grande maravilha e admiração
no povo francês.
Em segundo lugar, impressionaram-me os centros de formação profissional
e as escolas agrícolas de alto nível, algumas delas com um número muito
grande de internos. Não teria imaginado esse tipo de presenças num país
que está entre os mais evoluídos da Europa. As escolas técnicas industriais
assim como as agrícolas, além do fato de estarem em linha com um setor
tipicamente salesiano, nos permitem acompanhar e educar os jovens do
mundo do trabalho e do campo, também em contextos ricos e abastados;
o que não é indiferente, malgrado o desequilíbrio entre os recursos
humanos disponíveis e as tarefas a enfrentar. Parece-me ter descoberto
um grande sentido de responsabilidade no campo da missão salesiana.
A terceira iniciativa interessante é a construção de um centro de formação
salesiana para os leigos em Lyon, que deverá ser inaugurado dentro de
um ano. É um sinal da identidade salesiana que se verifica na missão,
do amor a Dom Bosco a que aludimos, da capacidade de acreditar no seu
carisma e do empenho em partilhá-lo e difundi-lo, em linha com a práxis
de Dom Bosco e fiel às orientações dos últimos Capítulos Gerais, particularmente
– em referência à iniciativa de Lyon – o CG24.
4.3 Na Polônia
Na Polônia visitei as quatro inspetorias: Cracóvia, Pila, Varsóvia,
Wroclaw. A visita a cada inspetoria tinha sido cuidadosamente preparada,
e não obstante a dificuldade da língua transcorreu muito bem.
• Contato com as origens
Primeiramente, a visita a Cracóvia. A experiência que mais me impressionou
foi talvez a visita a Oswiecim, a obra inicial da presença salesiana
na Polônia. Um lugar donde o carisma salesiano difundiu-se por toda
a nação, e também pelo Leste da Europa, de uma maneira tão fecunda que
hoje temos mais de mil salesianos na Polônia. Oswiecim torna-se eloqüente
também pela sua mesma situação. Encontra-se muito perto, distante não
mais de 5 quilômetros do campo de concentração de Auschwitz, onde esteve
o maior cemitério do mundo nos anos 40-45! É estimulante pensar que
nos arredores desse grande cemitério, a expressão mais trágica de uma
anticultura de morte, havia uma obra onde a vida, à maneira de uma
semente, crescia contemporaneamente e se desenvolvia gerando esperança.
Causa surpresa ver a fecundidade vocacional do passado e também do presente,
o profundo sentido religioso do povo, a tenacidade em conservar a própria
identidade. Os salesianos estão conscientes de que o ingresso da Polônia
na comunidade européia trará juntamente com o bem-estar uma mudança
cultural; eles estão prontos para bem enfrentá-la.
• Dinamismo da Família Salesiana e do Movimento Juvenil Salesiano
Em Wrocla, o evento principal foi uma grande e solene celebração no
renomado Santuário de Nossa Senhora de Czestochowa. É o coração espiritual
da Polônia, onde se pode sentir sua densidade religiosa. Foi para mim
um momento pessoal de grande emoção. Todavia, do ponto de vista da animação,
o momento mais interessante foi o encontro com toda a Família Salesiana,
do qual participavam alguns jovens oratorianos do oratório de Poznam.
Eles nos mostraram a primeira parte do filme que estão produzindo sobre
os cinco jovens mártires de Poznam. Foi um prazer ouvir-lhes a narração,
a maneira como se sentem identificados com aqueles jovens mártires.
Sabem que são verdadeiramente herdeiros de um tesouro espiritual que
deve ser transmitido! Não penso que seja um exagero dizer que, depois
do oratório de Valdocco, o oratório de Poznam deve ser tido como o oratório
mais famoso de todo o mundo, no qual floresceu a santidade, não somente
pelo martírio, mas pela qualidade de vida salesiana. A beatificação
dos jovens mártires evidenciou os traços de personalidade que eles tinham
desenvolvido no oratório. Disso estavam conscientes aqueles jovens que,
apresentando o filme, confessavam: “Somos depositários de um tesouro
que deve ser transmitido aos jovens do mundo”. Foram esses jovens que
apresentaram a mensagem e o testemunho, e eu dizia de mim para mim:
que mais posso acrescentar? Ouvimos o que é capaz de fazer um oratório
salesiano: criar personalidades robustas que se manifestam justamente
nos tempos de crise, jovens que tiveram um encontro com Cristo, jovens
que aprenderam a servir, jovens que sabiam que sua fé podia levar até
ao martírio, jovens de uma grande esperança, a da vitória do bem sobre
o mal. A história deu-lhes razão. Três anos apenas após seu sacrifício,
o nazismo acabou. Assim aconteceu anos depois com a ideologia comunista,
o que significa que naqueles oratorianos temos uma santidade juvenil
madura.
• Um “novo” campo da missão salesiana
Em Pila. Tivemos uma celebração estupenda, com tamanha participação
que a igreja, magnífica, era insuficiente para acolher a todos. Mas
a experiência que mais me tocou foi o encontro com toda a comunidade
educativa da escola de Aleksandrów Kujawski, porque me fez ver a nova
posição dos salesianos da Polônia no campo da escola, com grande sucesso.
Veio falar a senhora ministra da Cultura, que agradeceu em nome do governo
polonês o trabalho que os salesianos da Polônia estão desenvolvendo
no setor educativo. Há apenas dez anos que os irmãos voltaram a operar
no mundo da escola, e em dez anos houve uma virada profunda e de futuro.
Trata-se de um fato relevante, porque os salesianos jovens não tinham
experiência no campo da educação formal, e descobriram que é um campo
muito promissor e que se pode fazer ainda muitíssimo pelos jovens e
com os jovens nesse contexto.
• Casas de formação e centros de estudo
A visita a Varsóvia concentrou-se no dia passado em Czerwinsk, com a
possibilidade de um encontro com a maior parte dos irmãos, mas que me
deu também a oportunidade de fazer uma idéia mais completa e apreciar
melhor as casas de formação da Polônia: os noviciados de Kopiec (PLO)
e de Czerwinsk, e os centros de estudo em Cracóvia, Lodz e Lad (PLN).
Este último celebrava seu 50º aniversário. Após a solene celebração
religiosa e acadêmica, que coincidia com a inauguração do ano, tive
um encontro com o grupo de professores que trabalham nos nossos centros
de estudo e no mundo universitário. Vendo seu número e a qualidade do
serviço que prestam, pude verificar que as inspetorias souberam investir
na preparação do pessoal em tempos assaz difíceis, e têm irmãos muito
qualificados, tornando muito importante nossa presença no setor universitário
salesiano e eclesial.
4.4 Na Argentina
Na viagem à Argentina visitei as cinco inspetorias seguindo esta ordem:
Buenos Aires, Bahia Blanca, La Plata, Córdoba, Rosario.
Foram dois os motivos que me levaram a aceitar o convite que me foi
feito durante os dias do Capítulo, ainda que inicialmente houvesse fixado
como critério para as visitas dar prioridade às inspetorias que não
tinham sido visitadas nem pelo padre Vecchi, nem, no seu último sexênio,
pelo padre Viganó, justamente por causa das doenças que os acometeram.
A primeira razão era a homenagem que os irmãos e membros da Família
Salesiana da Inspetoria de Bahía Blanca queriam prestar ao padre Vecchi,
ao qual dedicaram uma escola em Viedma e um museu em Fortín Mercedes,
e ao senhor Zatti, com cujo nome intitularam outra escola, também em
Viedma.
O segundo motivo era o desejo de estar junto aos irmãos da Argentina
na difícil situação econômica que o país está vivendo.
Sem entrar nos detalhes da visita, descobri na Argentina uma presença
de Congregação muito significativa, não somente pelo número das inspetorias,
embora algumas delas sejam agora numericamente pequenas, mas sobretudo
por uma realidade reconhecida por todos – autoridades civis e eclesiais,
empresários e mundo intelectual, gente do lugar e de outras partes
–, isto é, a capacidade de haver criado cultura na Patagônia. É um juízo
que já tinha ouvido de
alguns jesuítas anos atrás, quando fazia uma visita a Punta Arenas.
Torna-se difícil para quem nunca visitou a Patagônia imaginar a contribuição,
em termos de civilização e de cultura, dada pelos nossos irmãos. Devo
reconhecer que me senti orgulhoso deles!
Também nessa terra o carisma foi fielmente implantado e frutificou.
Pode-se vê-lo no desenvolvimento vocacional que teve no passado, também
com a presença de missionários argentinos em várias partes do mundo;
a Argentina – lembremos – deu o primeiro Reitor-Mor nascido fora da
Itália. Sobretudo deu frutos de santidade, que é a verdadeira prova
da inculturação de um carisma: a santidade de Laura Vicuña, chilena,
que amadureceu e morreu nessa terra, e cujos restos mortais se encontram
em Bahia Blanca. Assim também a santidade de Zeferino Namuncurá, que
é um fenômeno religioso social muito maior do que possamos imaginar,
como o demonstra a parede de inscrições de agradecimento por graças
recebidas pela sua intercessão, que se encontra em Fortín Mercedes;
e, naturalmente, a santidade do senhor Artêmides Zatti.
4.5 Nas Filipinas e na Tailândia
• Motivos da viagem
A primeira motivação da viagem prendia-se à celebração do 50º aniversário
do início da presença dos salesianos nas Filipinas, que ocorria dois
anos faz. Padre Vecchi tinha assumido o compromisso de estar presente
nas inspetorias para essa importante ocasião, mas a doença não permitiu
que as celebrações fossem feitas nas datas precisas.
Deve-se também dizer que os primeiros salesianos que chegaram às Filipinas
tinham sido dois irmãos procedentes do México muitos anos antes: padre
Guilherme Piani, que foi como delegado apostólico e depois retornou
ao México como núncio apostólico; ele levou consigo um padre mexicano
que nasceu no Texas mas viveu na cidade de Puebla (México), Luís Laravoire
Morrow, que anos depois se tornaria bispo da Diocese de Krishnagar,
Índia. Oficialmente os salesianos chegaram às Filipinas em 1950. De
qualquer maneira, minha presença celebrou também, de modo particular,
a ocorrência do 50º aniversário da escola de Mandaluyong, o Don Bosco
Tecnological Center.
Na Tailândia celebrava-se o 75º aniversário da presença salesiana. Os
primeiros missionários que lá chegaram foram os irmãos expulsos da China.
É fato muito interessante, digno de uma reflexão histórica: a China,
providencialmente, está se revelando como a inspetoria-mãe de várias
outras inspetorias da Ásia, pois tendo sido expulsos, os salesianos
desembarcaram em outras nações. O êxodo da China produziu a plantatio
do carisma em outras terras, ampliando destarte a presença salesiana
na Ásia. Provavelmente o estudo histórico que um irmão está elaborando
em preparação da celebração do centenário da presença salesiana na China
nos oferecerá idéias e elementos sobre estas páginas de história salesiana.
O tema certamente merece uma verdadeira pesquisa.
Último motivo, “last but non least”, na base de minha viagem
no Extremo Oriente, esteve o convite para pregar os exercícios espirituais
aos inspetores e aos delegados das inspetorias e delegações das duas
regiões da Ásia. Este é um elemento que considero muito importante do
ponto de vista da animação do Reitor-Mor, pelo efeito multiplicado que
pode ter tal intervenção.
• A visita nas Filipinas
O fato mais importante dos dias que passei na Inspetoria de Manila
foi sem dúvida a visita feita a quase todas as obras. Acho que me
encontrei com todos os irmãos, os diretores e as comunidades, os formadores
e os jovens salesianos em formação, os doentes e também a Família Salesiana.
As presenças mais marcantes na Inspetoria de Manila são, em minha opinião,
os Technological Training Centres, que os irmãos desenvolvem
tanto na cidade como no campo, dando preferência e atenção aos meninos
marginalizados pela educação sistemática institucional. Existe de fato
o empenho de tornar operativa a decisão tomada no último Capítulo Inspetorial
de fortalecer os centros de formação profissional no campo, tendo em
consideração o fato de as Filipinas continuarem a ser um país fundamentalmente
agrícola, com os 75% da população juvenil que vive no campo. Encontrei
também uma presença consistente entre os meninos de rua, com três obras
significativas. De modo particular destacaria a obra de Tondo, verdadeiro
“slum”, um dos bairros mais pobres, populosos e populares de
Manila, onde a presença salesiana é sinal de esperança e de vida. Confesso
que me emocionei profundamente ao ver a vontade de viver dessa gente,
a capacidade de acreditar no próprio futuro, enquanto se sabe acompanhada
e benquista pelos nossos irmãos salesianos e irmãs salesianas.
Na Inspetoria de Cebu comecei a visita na primeira casa salesiana das
Filipinas. Victorias, na ilha de Negros, presença muito próxima à diocese
que foi confiada ao ex-inspetor padre Patrick Buzon, consagrado em 19
de fevereiro passado.
Também nessa inspetoria a presença em favor dos meninos de rua e da
população mais abandonada é significativa.
Visitando o oratório de Pasil, num dos bairros mais pobres de Cebu,
dei-me conta do trabalho fecundo que os irmãos realizam entre os meninos,
e de como está bem desenvolvida a religiosidade entre aquela gente,
embora seja ainda preciso fazer muito do ponto de vista da promoção
social. É uma obra bastante semelhante à de Tondo. Ver os nossos irmãos
nesses lugares, o que fazem com os jovens e pelos jovens, nos liga às
nossas humildes origens e nos garante o sucesso que é fruto da fidelidade.
Não vos escondo que entre eles me senti orgulhoso de ser salesiano!
• Algumas considerações
Impressiona, por um lado, a imensa religiosidade popular do povo filipino;
de certo modo é uma expressão inculturada da fé, que, entretanto, ainda
precisa ser evangelizada até atingir maior unidade entre fé e vida.
Por outro lado impressiona constatar na juventude certa perda de identidade
cultural. Pareceu-me que o povo filipino tem uma rica raiz cultural,
mas ao mesmo tempo se sente muito condicionado pelo modelo de vida ocidental.
A presença maciça dos jovens nas nossas obras e sua abertura disponível
à proposta religiosa, causa certamente satisfação, mas faz também refletir
sobre o porquê da atual escassez de vocações. Basta pensar que este
ano há apenas cinco noviços: um da Inspetoria de Manila, dois da Inspetoria
de Cebu e dois da China. Creio que se deveria aprofundar a reflexão.
A primeira consideração espontânea que surge é a da falta seja de um
acompanhamento mais qualificado e propositivo dos numerosos jovens e
grupos que, certamente e com espírito de sacrifício, cuidamos nos nossos
ambientes, seja de uma proposta muito mais clara, decidida e convincente.
Faz-se mister a presença no meio dos meninos, a credibilidade e o testemunho,
um ambiente que educa, no qual se respire a salesianidade, uma grande
profissionalidade no “management”, mas sobretudo na mística e
na espiritulidade do “Da mihi animas”, em suma, comunidades
que amem os jovens e sejam sinais do amor de Cristo para com eles. A
vocação implica a proposta, mas é fruto de uma presença atraente, espiritualmente
intensa, apostolicamente empenhada. É o que chamamos de Pastoral
Juvenil de qualidade. Isso vale, evidentemente, para qualquer inspetoria
e para qualquer comunidade.
Não devemos esquecer que as Filipinas – juntamente com o Timor Leste
– são o único país católico da Ásia. Este dado confere à Igreja do
país uma grande responsabilidade histórica, que deveria traduzir-se
não tanto, ou não antes de tudo, no esforço de converter ao cristianismo
os outros países do continente quanto em ser paradigma, modelo de coisa.
Significa ser um país católico, rico de valores cristãos.
• A visita na Tailândia
Os primeiros dois dias na Inspetoria da Tailândia caracterizaram-se
pelas grandiosas celebrações organizadas para o jubileu da presença
salesiana, muito bem preparadas tanto as religiosas como as civis, das
quais participaram milhares – não exagero! – de meninos. Entre as primeiras,
a missa presidida pelo cardeal Michael Kitbunchu no dia da Festa de
São Francisco de Sales. Entre as segundas, a que teve como cenário o
estádio coberto de Bangcoc, com uma participação de mais de 8 mil jovens,
representando 22 escolas que os grupos da Família Salesiana dirigem
na capital: Salesianos, Filhas de Maria Auxiliadora, Irmãs do Imaculado
Coração de Maria, Filhas da Realeza de Maria, estas últimas fundadas,
as primeiras por dom Pedro Carretto, e as segundas pelo padre Carlos
Della Torre.
Deve-se salientar esse testemunho de sinergia e de colaboração de toda
a Família Salesiana, na qual se destaca, sem mais, o envolvimento muito
forte dos ex-alunos, tanto católicos, uma minoria, como budistas. O
presidente anterior da Associação dos Ex-alunos era budista, e esteve
conosco todos os dias da visita, conhece e ama muito Dom Bosco. É muito
empenhado e foi aluno não só na Tailândia, mas também na Austrália,
para onde se transferiu como emigrante, lá reencontrando os salesianos.
Na sua fala, o vice-primeiro ministro, também ele ex-aluno e budista,
fez um elogio extraordinário de Dom Bosco – e suas palavras têm um significado
ainda mais forte justamente porque provêm de um não-católico – e da
contribuição dada pelos salesianos em sentido amplo ao desenvolvimento
da sociedade tailandesa.
Foi entretanto o último dia de visita que me deu um quadro efetivo
e uma imagem mais completa da história dos salesianos na Tailândia,
da influência de sua presença na Igreja e na sociedade, de sua significatividade.
Foi um dia que começou muito cedo, de manhã, e se encerrou à noite,
quando chegamos ao aeroporto para voltar a Roma. Passamos de uma casa
a outra. Pude conhecer melhor a estatura e a importância de dois grandes
homens como dom Gaetano Pasotti e dom Pedro Carretto, ambos de grande
visão. Assim que chegaram através do rio, haviam-se instalado numa aldeia
chamada Bangnokkuek, onde agora se encontra a catedral, e donde a presença
salesiana se estendeu a outras cidades do país. Anos depois, com efeito,
dom Caretto deu-se conta de que aquele lugar oferecia poucas possibilidades
de expansão, também pela limitação territorial do rio, e decidiu mudar
o centro da diocese para Ratburi, onde construiu o grande templo dedicado
a Dom Bosco e uma escola que hoje tem 10 mil meninos. A coisa talvez
mais interessante é que os padres diocesanos aprenderam de dom Carretto
a trabalhar no campo da educação. Sinceramente devo dizer que se não
tivesse visto pessoalmente quais foram as origens da presença salesiana
na Tailândia, a evolução que houve com a conseqüente opção de ir a outras
cidades como Bangcoc, Banpong, Sampram e Huya Hin, não teria suficientemente
aprofundado o conhecimento da presença na Tailândia, onde encontrei
obras de fato muito significativas no campo da educação. Desta vez não
pude visitar os irmãos que trabalham com muito zelo em Camboja.
• Algumas considerações
Na Tailândia fiquei impressionado sobretudo com o desenvolvimento social
e econômico de um país que há apenas trinta anos era muito pobre e atingiu
um nível econômico superior ao de muitos países da América Latina. Isso
ajuda a compreender o deslocamento de interesse econômico, mas também
teológico, da América Latina para a Ásia.
Os grandes centros educativos com escolas como os Technological Training
Centres, que tinha visto nas Filipinas, e duas presenças em favor de
cegos, uma dirigida pelas FMA e outra pelos SDB, são verdadeiramente
significativas. A presença católica na nação é muito reduzida: os católicos
são apenas 400 mil, isto é, 0,5% da população, que é na maioria budista.
Mas é muito importante a inserção dos católicos em geral, e dos salesianos
de modo especial, no tecido da sociedade, sobretudo através da educação.
Nesse contexto creio que os salesianos têm tríplice grande desafio para
acolher e enfrentar: antes de tudo a identidade carismática, que se
deve cultivar com um conhecimento sempre maior e sempre mais aprofundado
de Dom Bosco, o cuidado dos mais pobres, como um elemento que pode tornar-nos
mais significativos num contexto budista, também porque se torna uma
opção contracultural; e as vocações, das quais depende sempre a vitalidade
e o futuro das inspetorias.
Esta primeira experiência no mundo oriental salesiano fez-me compreender
sobretudo duas coisas. Em primeiro lugar, o interesse que a Ásia está
despertando em nível econômico, social, religioso e teológico. Em segundo
lugar, a urgência da questão da inculturação do carisma, que será sempre
mais forte e sentida, e que implica de um lado grande identidade cultural,
mas de outro uma igualmente grande identidade salesiana. Trata-se de
um processo que deve ser absolutamente iluminado e acompanhado. Propus-me
escrever uma carta circular sobre o tema.
5. CONCLUSÃO
Concluo esperando ter atendido às expectativas de todos vós, interessados
como estais em tudo quanto acontece na Congregação. Nada dela deveria
ser indiferente para nós. O Reitor-Mor desenvolve uma tarefa carismática
e institucional; é importante que os irmãos estejam informados do exercício
de seu papel. A visita às comunidades representa o contato com a vida
da Congregação; ela se faz sempre mais rica com a melhor relação que
se possa fazer. As reflexões que apresento não querem exprimir um juízo
de valor, mas entendem ser uma leitura salesiana da nossa realidade,
para iluminar e estimular não somente cada uma das inspetorias mas toda
a Congregação.
Ao longo do sexênio, nas cartas familiares sobre a nossa vida, pedidas
pelo CG25, penso apresentar cada uma das oito Regiões, porque considero
muito importante que todos os salesianos tenham uma visão ampla da Congregação.
Faço votos por que esta partilha produza frutos de crescimento do sentido
de Congregação e da co-responsabilidade em todos nós. Estas comunicações
ajudam de fato a reforçar a comunhão afetiva e efetiva, a pertença carismática
e o espírito de família; justamente por isso, julgo que este gênero
de comunicação deveria realizar-se em todos os níveis, inclusive o inspetorial
e local.
Comecei esta carta com as palavras de Dom Bosco “perto ou longe penso
sempre em vós”. Quero concluí-la garantindo minha permanente lembrança
no afeto e na Eucaristia de cada dia.
Enquanto vos escrevo, sopram fortes ventos de guerra e não posso deixar
de lembrar as mensagens que me dirigiram os jovens de Bagdá, que sonham
um mundo de paz, onde possam também eles desenvolver todas as suas potencialidades
e atingir a plenitude de vida. Neste ano do Rosário rezemos pela paz
do mundo; confiemos a Maria, à Virgem da Anunciação, a graça de trazer-nos
a boa nova da paz, que é dom e tarefa, que é “compromisso permanente”,
como nos disse João Paulo II na Mensagem para o Dia da Paz deste ano
de 2003, que cria as condições melhores para crescer em comunhão e fraternidade.
“Façamos de cada família e de cada comunidade ‘a casa e a escola da
comunhão’.”
P. Pascual Chávez Villanueva
[1] “Carta de Roma”, Atos do Capítulo Superior da Pia Sociedade Salesiana 1 (1920), n. 1.