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“Sereis as minhas testemunhas...”

CARTAS DO REITOR-MOR PASCUAL CHÁVEZ


«SEREIS AS MINHAS TESTEMUNHAS...
ATÉ OS CONFINS DA TERRA»
(At 1, 8b) Apresentação da Região Itália e Oriente Médio

Notícias de família – O significado desta carta – Dois eventos merecem ser valorizados – Preito de gratidão – A situação da Itália – A situação do Oriente Médio – A Região do ponto de vista salesiano. 1. O pessoal. 2. As presenças salesianas. 3. Tipologia das presenças. 4. Alguns destaques obrigatórios. 5. As comunidades salesianas. Quantidade e qualidade. 6. A Família Salesiana. 7. Participação e formação dos leigos: recursos e problemas.Os grandes desafios da Região. 1. A situação vocacional. 2. Redimensionamento e recolocação. 3. A formação contínua. 4. A presença salesiana no Oriente Médio.Linhas de futuro. 1. Repensar a nossa proposta educativa pastoral. 2. Redefinir com coragem a presença salesiana na Itália. 3. Qualificar o caminho de formação para os nossos colaboradores leigos. 4. O apoio à Inspetoria do Oriente Médio. 5. Valorização dos lugares salesianos.Estou próximo de todos vós – Concluindo.

Roma, 25 de março de 2004
Solenidade da Anunciação do Senhor

Caríssimos Irmãos,
Saúdo-vos com o afeto de sempre, porque vos trago no coração. Três meses são passados desde minha última carta, na qual vos convidava a contemplar Jesus com o olhar de Dom Bosco, e da comunicação da Estréia 2004, na qual fazia um apelo a toda a Família Salesiana a “propor com convicção a todos os jovens a alegria e o compromisso da santidade, como medida alta de vida cristã ordinária”.

Notícias de Família

Foram meses cheios, nos quais aconteceram alguns fatos importantes para a nossa Congregação. O primeiro foi a nomeação pelo Santo Padre do padre Luc Van Looy para Bispo da Diocese de Gent, Bélgica. A nomeação chegou-nos como uma nova expressão da estima que a Santa Sé tem pela Congregação Salesiana, mas ao mesmo tempo privou-nos da pessoa do padre Luc, que cumpria a responsabilidade de Vigário de Reitor-Mor. Desejo aqui renovar-lhe o reconhecimento, meu e de todos vós, pelo grande serviço prestado à Congregação Salesiana, antes como missionário e delegado na Inspetoria da Coréia, em seguida como conselheiro geral para as Missões, depois como conselheiro geral para a Pastoral Juvenil, enfim, por oito anos vigário do Reitor-Mor.
Após a nomeação convoquei o Conselho para uma consulta que me ajudasse no discernimento e nomeei o padre Adriano Bregolin como novo vigário do Reitor-Mor e, num segundo momento, procedi à nomeação do padre Píer Fausto Frisoli como novo conselheiro para a Itália e o Oriente Médio. Vai também a eles meu agradecimento por terem aceitado os encargos e a expressão da minha confiança para um trabalho salesiano fecundo e eficaz. Destarte, o Conselho Geral voltou, na fase conclusiva da sessão de inverno, a estar completo, em espírito de unidade e de plena colaboração.
Outro fato importante, do qual quero torná-los participantes, é a convenção estipulada entre a Secretaria de Estado do Vaticano e a Congregação Salesiana para a direção do “Instituto Ratisbonne” em Jerusalém. A sede desse instituto, por muitos anos sede do “Centro de Estudos Judeu-Cristãos”, foi confiada por um período de cerca de cinqüenta anos, renováveis, à Congregação Salesiana e vai tornar-se, a partir do próximo ano, a nova sede do estudantado de teologia, até agora em Cremisan. Nessa proposta, apresentada diretamente pela Santa Sé, vemos a possibilidade de qualificar esta nossa presença formativa em favor de irmãos estudantes de todas as regiões salesianas do mundo. Gradualmente, o ensino passará da língua italiana à inglesa. A colocação em Jerusalém deveria favorecer o contato com os outros centros de estudos teológicos ou bíblicos e, ao mesmo tempo, a casa poderia tornar-se um significativo ponto de referência para qualificadas iniciativas de formação, mesmo temporárias, de irmãos das várias inspetorias.

O significado desta carta

Entendo com esta carta dar início à apresentação das oito regiões do mundo salesiano, como já havia anunciado. Alternarei – como fiz até agora – essa visita às regiões com outras cartas de reflexão mais forte sobre a nossa espiritualidade. Isso poderá oferecer a todos vós uma visão panorâmica geral e atual da situação da nossa Congregação nos vários continentes e contextos, vos ajudará a crescer em sentido de pertença e vos tornará sempre mais reconhecidos e co-responsáveis.
Apresento, em primeiro lugar, a Região Itália e Oriente Médio. Parece-me justo começar por essa Região, que representa a pátria de Dom Bosco e do carisma salesiano. A citação da qual tomei o título é muito eloqüente. Trata-se de uma afirmação no contexto da Ascensão do Senhor Jesus, que não volta ao Pai sem antes anunciar a vinda do Espírito – que será, além de dom, o “prolongamento” de Cristo –, e sem dar aos discípulos como missão a de serem suas testemunhas e indicar como campo todo o mundo, começando por Jerusalém “até os confins da terra”.
De modo análogo, os primeiros discípulos de Dom Bosco receberam o seu “espírito” e, animados por forte dinamismo aprendido do nosso amado fundador e pai, sem saudades no coração e com a mesma paixão educativa, espalharam-se por toda a terra, prolongando no tempo e na história sua missão em favor dos jovens, especialmente “os mais pobres, necessitados e em perigo”. Dessa forma, a história do pai prosseguiu e continua a prolongar-se na vida dos seus filhos em cada continente, formando um todo único; ao mesmo tempo, deixou lugares e acontecimentos que são ponto de referência e critério de autenticidade. Assim a diversidade dos contextos enriquece o carisma com formas sempre novas de expressão, e estas encontram sua unidade na identidade carismática.

Dois eventos merecem ser valorizados
No começo desta carta não posso, porém, esquecer dois fatos que reputo verdadeiramente significativos para toda a nossa Família Salesiana.

O primeiro é a peregrinação das Relíquias de São Domingo Sávio nas várias regiões da Itália. Enquanto escrevo, a urna do jovem santo acaba de passar pelas terras da Liguria e da Toscana, num clima de grande e sentida acolhida. Nessas primeiras etapas, foram milhares as pessoas que quiseram estar presentes às celebrações ou a algum momento de oração junto à urna desse pequeno “grande” santo ou, para usar as palavras de Pio XII, desse “pequeno gigante do espírito”.
Atualmente a peregrinação está sendo realizada nas Marcas e no Abruzzo, depois no Veneto e, nas próximas semanas, atingirá as outras regiões, chegando a Roma nas proximidades do Domingo de Ramos, que há anos se tornou um encontro significativo para os jovens mais comprometidos. Esse evento está se revelando para a Itália inteira uma verdadeira graça e uma renovada mensagem de santidade. Pelas mensagens que recebo, sei que os jovens ficam impressionados e estimulados pela figura desse menino do Oratório de Valdocco, que, guiado por Dom Bosco, atingiu “uma alta medida de vida cristã cotidiana” juvenil. Para muitos salesianos, a celebração deste jubileu está se tornando quase uma redescoberta de eficácia da nossa proposta educativa e evangelizadora.

O outro fato importante é a próxima beatificação de três membros da Família Salesiana: padre Augusto Czartoryski, salesiano, irmã Eusébia Palomino, Filha de Maria Auxiliadora, Alexandrina M. da Costa, cooperadora salesiana. Nunca as beatificações anteriores haviam colocado a Família Salesiana diante de nós de um modo tão eficaz, a ponto de ser considerada, mais propriamente por todos nós e por quantos observam a realidade salesiana, como uma “família de santidade”. Confirmando esse fato realizar-se-á, no próximo outono, a beatificação de Alberto Marvelli, ex-aluno salesiano. Ao falar-vos de tais eventos sinto-me tomado de alegria e de esperança e quereria que isso fosse também o sentimento de todos vós.
No discurso de encerramento do CG25, ao falar da beatificação do padre Luís Variara, do senhor Artêmides Zatti e da irmã Maria Romero, dizia: “Estes beatos, que se somam à numerosa legião da santidade da nossa Família carismática, têm em comum o dom jubiloso de si e a dedicação generosa aos mais pobres. Não há nada que atraia tanto como o testemunho do doar-se sem restrição, sem condições. Não há nada que fascine tanto como o serviço aos mais pobres, aos mais humildes, aos mais necessitados. Os leprosos do padre Variara, os doentes do senhor Zatti, as meninas abandonadas de irmã Romero lembram imediatamente a oferta gratuita da vida dessas três figuras que nos são propostas como modelos. O cuidado dos mais pobres e o dom total de si conjugam-se, testemunhando com a caridade heróica dos três novos beatos”.

Agora, as novas beatificações ocorrem em continuidade, até cronologicamente próxima, de atenção às várias expressões da santidade salesiana. Um novo terno de beatos é-nos agora proposto, poderíamos dizer uma trilogia, porque os três beatos se tornam proposta para nós e para os jovens das três maneiras fundamentais de viver e acolher a vocação salesiana. É importante então reconhecer os traços fisionômicos dessas figuras, para ver sua peculiaridade e a multiformidade dentro da única experiência carismática salesiana. Na preparação da celebração de beatificação, que se realizará no próximo dia 25 de abril, foram preparados já diversos subsídios que procuram justamente fazer-nos conhecer melhor o caminho exterior e interior desses membros da nossa Família.

Juntos, os dois fatos nos permitem uma primeira consideração com respeito ao conteúdo desta carta. A santidade, dom de Deus, que sempre encontrou a possibilidade de encarnar-se em corações generosos e abertos a Deus, como o de Dom Bosco, é um dom irradiante. Domingos Sávio é o fruto mais belo da ação educativa e apostólica de Dom Bosco, mas essa mensagem de santidade tornou-se depois cada vez maior, e hoje, justamente, poderíamos dizer que se difundiu “até os confins da terra”. Da humilde casa dos Becchi à cidade de Turim, de Turim a toda a Itália e da Itália ao mundo inteiro. Basta pensar no álbum de jovens santos salesianos ao qual foi dedicado o calendário do Bollettino Salesiano 2004, a maior parte dos quais quis modelar a vida sobre a de Domingos Sávio.

A segunda consideração é que todo dom de Deus, como o das beatificações de alguns membros da Família Salesiana, representa sempre para todos nós um “novo chamado” a viver em profundidade e com alegria a nossa vocação salesiana. Esses sinais de fecundidade espiritual estimulam o nosso caminho espiritual e dão nova força à nossa missão. O fato de os três pertencerem a diversos ramos da Família Salesiana, e justamente aos fundados diretamente por Dom Bosco, e de representarem as vocações fundamentais dentro dela, confirma a convicção de que pertencemos a uma “família santa”, e que nela, consagrados ou leigos, homens ou mulheres, adultos ou jovens, podem santificar-se percorrendo o caminho espiritual e pastoral-educativo de Dom Bosco.

Preito de gratidão

Gostaria de apresentar-vos agora a realidade da Congregação Salesiana na Itália como sinal do reconhecimento a Deus por haver suscitado, nesta terra, nosso Pai Dom Bosco, outros numerosos santos da Família Salesiana e legiões de generosos irmãos que, fazendo-se intérpretes fiéis do carisma, levaram a presença salesiana a muitíssimas partes do mundo.
Todos lembrarão que desejei dizer isto, desde minha primeira “boa-noite” como Reitor-Mor. Afirmei: “Sou o primeiro Reitor-Mor que não é italiano de origem (o padre Vecchi era argentino, mas de pais italianos)... Aproveito a ocasião para agradecer a toda a Itália salesiana, que soube até agora cumprir sua responsabilidade histórica de transmitir fielmente o carisma de Dom Bosco. Obrigado, caríssimos irmãos italianos...” (cf. CG25, n. 179).

É muito natural pensar neste momento em como esse milagre de expansão se realizou com grande rapidez, graças à disponibilidade de salesianos generosos enviados primeiro por Dom Bosco e depois pelos sucessivos Reitores-Mores. Primeiro a França e a Argentina (1875), depois o Uruguai (1876), a Patagônia (1879), a Espanha (1881), a Inglaterra (1887)... Assim e sempre mais! Uma impressionante sucessão de fundações! Grande fé, grande entusiasmo e ainda uma generosidade extraordinária que se podia medir na repetição, cada vez mais consistente, das expedições missionárias. A título de exemplo: 71 missionários em 1891, três anos apenas após a morte de Dom Bosco, 92 em 1895, 126 em 1898! De nação em nação, de continente em continente.

É justo lembrar que as novas fundações foram, em grande parte, obra de irmãos provenientes da Itália. Salesianos que tinham recebido uma formação sólida e genuína diretamente de Dom Bosco ou de qualquer maneira dos salesianos da primeira geração, os que tinham pessoalmente conhecido o nosso querido Pai Fundador. Um espírito salesiano acolhido em toda a sua genuinidade, transmitido vitalmente com grande fidelidade e, com o transcorrer dos decênios, numa sempre mais atenta consideração da cultura nova na qual ia implantar-se.

Assim encontramos, no início de cada grande empresa, pioneiros do espírito salesiano. De Cagliero, Costamagna, Fagnano para a América Latina, ao padre Branda e depois padre Rinaldi e padre Ricaldone para a Espanha, padre Rabagliati para a Colômbia, padre Piperni e padre Piccono para o México, padre Jorge Tomatis para a Índia, padre Versiglia para a China, padre Cimatti para o Japão... Uma legião formidável de nossos irmãos, que iniciavam obras, mas sobretudo transmitiam a outros jovens, de forma genuína e viva, a vocação salesiana.

A vocação missionária da Itália e dos irmãos italianos continua ainda hoje. Podem mudar os números, mas a boa qualidade permanece. Assim, também nestes anos, várias presenças na África e na América Latina, sob forma de instituições irmãs foram e são ainda hoje sustentadas com uma missionariedade nova das inspetorias italianas, que muitas vezes ofereceram pessoas e meios para que o carisma de Dom Bosco atinja os jovens daquelas terras.

Penso que o que vos disse foi um verdadeiro milagre de fecundidade, mas me parece importante lembrar também como na mesma Itália o dom da vocação salesiana foi sempre conservado com cuidado e fidelidade, dando um pouco a todas as inspetorias do mundo um ponto de referência significativo no plano do empenho e do testemunho. Parece-me forçoso lembrar aqui todo o pessoal fornecido pelas inspetorias italianas para atender as obras dependentes do Reitor-Mor, as dos anos passados e as de hoje. Sob esse aspecto, não posso deixar de aludir ao pessoal dedicado à pesquisa no campo da história, da pedagogia e da espiritualidade salesiana, que prestou um serviço preciosíssimo a toda a Congregação.

Obrigado, pois, queridos irmãos da Itália, inseridos nas várias comunidades ou inspetorias da península, ou missionários no mundo. Sabei que a Congregação e o próprio Reitor-Mor vos são agradecidos. A responsabilidade histórica a vós confiada e tão fielmente gerida passou agora a todos, e todos nos sentimos chamados a encarnar Dom Bosco onde quer que nos encontremos inseridos ou enviados pela obediência (cf. CG25, n. 179).

A situação da Itália

Para melhor focalizar o que é a presença salesiana na Itália, parece-me oportuno apresentar-vos, sobretudo aos que vivem em contextos distantes do italiano e europeu, um breve quadro da situação geral do país. Hoje a Itália conta pouco menos de 60 milhões de habitantes. A natalidade, sobretudo na regiões do Norte, ostenta percentuais muito baixos. São sempre mais numerosas as famílias que optam por ter só um ou dois filhos. A conseqüência é, pois, um difuso envelhecimento da população. A falta de “força trabalho”, sobretudo nas profissões mais simples e humildes e, mais ainda, a perspectiva de uma vida mais digna, levaram muitos emigrantes a vir para “il Bel Paese”, notadamente das regiões do Magreb, dos Países Balcânicos, do Leste europeu e, em medida menor, do Oriente Médio, das Filipinas e da América Latina. Esse fenômeno de imigração maciça interessa a Itália de um período relativamente breve e implica, hoje, um processo de adaptação e integração que progride um tanto lentamente.

Do ponto de vista econômico, a Itália é uma das Nações que mais progrediram, mas dentro do País encontram-se dados discordantes entre o Norte, fortemente industrializado e organizado no plano social, e o Sul, muitas vezes com índices de desocupação muito altos e com graves problemas sociais. Assim, enquanto são absorvidos milhares de imigrados do exterior, contemporaneamente a própria Itália, relativamente aos seus cidadãos, não fechou de todo o fluxo de emigração interna e externa por razões de trabalho. Por esse e outros problemas, o panorama político é muitas vezes perturbado por excessiva conflitualidade entre blocos partidários, ou entre o setor empresarial e as várias representações sindicais dos trabalhadores.

No plano religioso, a Itália é um país tradicionalmente católico. Como todos os países da Europa ocidental foi, todavia, atacada por um forte movimento de secularização, e muitas vezes o aspecto religioso é vivido de maneira um tanto superficial, sem forte envolvimento no plano do compromisso cristão. Alguns sinais parecem também preocupantes, como o crescimento dos matrimônios civis, a queda das vocações sacerdotais e religiosas, a reduzida participação na comunidade eclesial, o distanciamento dos jovens.

Não obstante, a Itália demonstra ter ainda “um casco duro”, isto é uma faixa de população que vive com intensidade a dimensão religiosa e cultiva com assiduidade um conjunto de valores de inspiração profundamente cristã. Devem ser sublinhados os mui numerosos grupos de voluntariado social, civil e religioso, que se manifestam em mil formas de solidariedade. É de notar ainda a sensibilidade tipicamente cristã de tantos indivíduos e famílias, que se exprime em generosas formas de beneficência em favor principalmente de instituições eclesiais, de presenças missionárias, de formas assistenciais para os mais pobres.

A situação do Oriente Médio

No que tange ao Oriente Médio, podemos constatar uma situação notavelmente mais complexa. Todos conhecemos a dureza do atual conflito entre o Estado hebraico e a realidade do povo palestino. Some-se a isso o estado de guerra, ainda não resolvido por um tratado de paz, entre o próprio Israel e alguns países árabes. A recente guerra contra o Iraque exacerbou as relações com o mundo ocidental. A não definição de alguns problemas ligados a minorias étnicas, como o povo curdo, acarreta novos problemas à convivência desses povos.

Do ponto de vista econômico, a situação de instabilidade política e a contínua ameaça de guerras não permitem um desenvolvimento seguro das economias locais. A grande fonte de riqueza proveniente do petróleo é controlada pelos governantes, que, porém, deixam de traduzi-la em intervenções significativas para a melhora das condições sociais e econômicas. As situações de pobreza são visíveis principalmente nos povos árabes. Os jovens muitas vezes se mostram desanimados ante a inexistência de uma efetiva perspectiva de futuro.

A Região do ponto de vista salesiano

A Região Itália e Oriente Médio tem hoje nove inspetorias na Itália e uma no Oriente Médio.

1. O pessoal
Na Itália, os irmãos são cerca de 2.800. No Oriente Médio, 118. A média de idade das várias inspetorias é notavelmente alta, ficando, nas diversas inspetorias, entre os 59 e os 65 anos. O número de noviços foi diminuindo. A média está entre os 30 e os 20 noviços (242 nos últimos sete anos), com uma diminuição mais acentuada no presente ano (19 noviços). Deve-se notar, todavia, um discreto nível de perseverança, mesmo no período dos votos temporários.
Sobre a diminuição do número global dos irmãos incide notavelmente o número dos falecidos (no sexênio 1998-2003 foram 488 na área CISI e 10 na Inspetoria MOR). Nestes últimos seis anos, cerca de 50 irmãos partiram para as missões e o número atual dos neo-professos não é obviamente suficiente para compensar tais perdas objetivas.

2. As presenças salesianas
No que concerne à abertura e fechamento das casas, houve na Região um movimento no duplo sentido, tanto na direção das aberturas quanto dos fechamentos. De 1998 a 2003 foram 11 as aberturas e 32 os fechamentos. Pode-se notar o aumento dos fechamentos, que marca o andamento destes últimos anos. Isso se deve, em parte, à conclusão de processos iniciados antes, não somente por questão do pessoal, mas também de escolhas de recolocação.

3.Tipologia das presenças
O número das comunidades salesianas sofreu nos últimos sexênios um redimensionamento progressivo. Havia na Itália 276 comunidades em 1990, 260 em 1996, 243 em 2000. Em 2003 são 235, das quais 228 eretas canonicamente.
No setor escola, pode-se dizer que – não obstante o inevitável enfraquecimento devido à falta de paridade econômica – permanece, na área CISI, um dos serviços mais significativos e mais difundidos.
Há na Itália 53 escolas médias, com cerca de 8 mil alunos e mais de 600 professores leigos. Na MOR são 3 as escolas médias, com cerca de 600 alunos. Na Itália funcionam 51 escolas superiores, com cerca de 12 mil alunos e mil professores leigos. Na MOR existem 6 escolas superiores.
Nestes últimos anos, os movimentos em vista da reforma escolar levaram a retomar também a gestão e a responsabilidade educativa de várias escolas elementares.
Substancial desenvolvimento ostenta o setor dos centros profissionais, que consta de 46 centros, com 13.400 alunos, e cerca de mil professores leigos (na Inspetoria MOR, 3 centros, 2.550 alunos, 23 professores). Note-se que, ao lado dos cursos de primeiro nível, que recolhem os adolescentes, que sempre foram os nossos destinatários, são já numerosos em todas as inspetorias cursos de segundo nível, que se dirigem a diversas tipologias de adultos, com conteúdos diferenciados.
As paróquias da Região são atualmente 137 (das quais 3 na MOR), com cerca de 1,02 milhão de fiéis. Os oratórios-centros juvenis são 177 (dos quais 13 na MOR), com várias dezenas de milhares de destinatários diretos.
As residências universitárias na área CISI são 32, com 1.340 jovens universitários.
As casas-família para menores em dificuldade são 18, com cerca de 300 internos. As obras para marginalizados (imigrados, toxicodependentes, primeiro alojamento etc.) são 15, com cerca de 2 mil abrigados, que são atingidos de maneiras diversas. São uma presença significativa no campo da marginalização.

Vital evidenciou-se nos últimos anos a dimensão missionária: de 1978 a 2003, partiram da área CISI cerca de 250 missionários (50, nos últimos seis anos). O número é notável, se se levar em consideração a escassez de pessoal de que sofre toda a Região.

4. Alguns destaques indispensáveis
Queridos irmãos, a só apresentação de dados estatísticos pode ser interessante, mas talvez não exprima toda a riqueza que a Itália soube ostentar e ainda ostenta dentro da Congregação Salesiana. Acrescento, pois, alguns destaques que me parecem indispensáveis, para completar a informação e o agradecimento.

Penso em primeiro lugar no grande serviço prestado à formação de tantos salesianos por casas e centros de estudo que, por anos, foram ponto de referência em nível internacional. Desejo referir-me em primeiro lugar ao Instituto Internacional da Crocetta de Turim, que por muitos anos foi sede do nosso Ateneu. Dessa experiência nasceu depois gradualmente a realidade da nossa Universidade de Roma. Quero lembrar também as Casas romanas de San Tarcisio e do Testaccio, que acolheram estudantes estrangeiros para seus cursos de estudo nas universidades eclesiásticas. Junto com elas, a Casa de Messina San Tommaso, que no passado, e ainda hoje, hospedou e hospeda estudantes de Teologia provenientes do exterior. Para um serviço análogo devo citar a Comunidade do Gerini, para estudantes, e os noviciados, hoje internacionais, de Pinerolo e Genzano.

Nesse contexto, como não dizer o meu obrigado também aos numerosos irmãos italianos que contribuíram com competência e grande visão para o nascimento e crescimento da nossa Universidade Pontifícia Salesiana? Também esse foi um grande empreendimento para o bem, para a formação especificamente salesiana, para o crescimento cultural e pastoral de muitos irmãos que hoje animam as nossas comunidades formativas no mundo.

Um segundo destaque faço-o às obras de formação profissional, com menção particular ao Colle Don Bosco e à Obra do Rebaudengo, como também à de Cumiana. Nesses ambientes, muitíssimos irmãos nossos coadjutores se formaram profissionalmente para um serviço qualificado e competente aos jovens aprendizes das escolas profissionais. Antigamente, as grandes obras salesianas qualificavam-se estruturalmente para uma divisão quase simétrica dos edificios. No centro, a igreja. De um lado, os meninos estudantes, e do outro os meninos aprendizes. Como para dizer que a missão salesiana não tinha limites nem exclusões. Qualquer menino podia ser acolhido para desenvolver seus dotes num percurso de estudos clássicos ou num percurso formativo que o levasse a ser artesão, empresário ou simplesmente operário especializado. Todos os jovens, estudantes e aprendizes trilhavam, juntos, seu caminho de crescimento educativo e cristão no contexto de uma animação intensa, que acompanhava sua experiência formativa: a banda, o teatro, as companhias e os grupos, a oração, os retiros e os exercícios espirituais... Era uma verdadeira experiência de vida plena e uma grande escola de vida. A igreja “no centro” lembrava a todos qual era a verdadeira fonte da animação salesiana e qual era o centro de convergência de todos.

Grande, realmente, o bem que essas nossas obras fizeram e ainda fazem. Penso, neste momento, nos grandes centros de Valdocco, de Sesto San Giovanni, de Verona San Zeno, de Mestre, de Genova Quarto, de Bolonha, de Roma, de L’Aquila, de Ortona, de Bari, de Catania, Palermo, Selargius e Lanusei... Lembro com alegria, após uma recente visita, a casa de Este, que vem a ser, na sua realidade, um verdadeiro milagre graças a uma “recolocação” interna. O grande e célebre colégio destinado sobretudo a jovens estudantes, num tempo de mudanças, no qual, como escola superior, corria o risco de fechamento, refloresceu graças à intuição e à dedicação de irmãos, principalmente coadjutores, que foram capazes de pensar e realizar a conversão para escola profissional.

É justo, pois, lembrar a dimensão original e carismática do nosso apostolado juvenil. E é justo repetir o agradecimento a tantos irmãos nossos coadjutores, que trabalharam com empenho e dedicação não somente na Itália, mas também em todo o mundo, fundando, por toda a parte, escolas destinadas aos jovens aprendizes.

Quero dedicar um terceiro ponto ao setor da Comunicação Social. Refiro-me, em primeiro lugar, ao extraordinário instrumento de animação e de difusão da espiritualidade salesiana que foi e é o “Bollettino Salesiano”. Uma idéia genial que partiu de Dom Bosco e é hoje belíssima realidade editorial distribuída a mais de 300 mil famílias. Nele, a Itália colhe as notícias do mundo salesiano, envolve-se no movimento espiritual da nossa Família Salesiana, participa ativamente com formas generosas de beneficência. A atual edição é bonita, ágil, juvenil e torna-se ponto de referência para muitas edições do Boletim de outras nações, em 32 línguas.

Devo lembrar ainda a Editora Elledici, fundada no tempo do padre Ricaldone, que por decênios agiu de maneira viva e criativa, escudada também na competência de peritos catequetas do Centro Catequético, dando à Igreja italiana contribuições qualificadas no campo da Catequese e da Pastoral Juvenil. Serviço igualmente meritório realizou e realiza a Società Editrice Internazionale, sobretudo com a produção de textos escolares.

Mais dois destaques importantes e cobertos de méritos. Primeiramente a presença de uma Comunidade Salesiana no Vaticano, “La Poliglotta”, que foi sempre “uma janela” através da qual a Santa Sé vê e estima a Congregação e uma natural e simples “porta de acesso” ao Santo Padre e às Congregações Romanas.

O segundo diz respeito à acolhida generosa dos missionários italianos que retornam às inspetorias de origem, idosos ou doentes, após terem doado suas melhores energias e predicados ao serviço da missão nas diversas inspetorias espalhadas pelo mundo. Um gesto de caridade para com as pessoas desses salesianos.

5. As comunidades salesianas. Quantidade e qualidade
Já observei que o número das comunidades salesianas sofreu um progressivo redimensionamento nos últimos sexênios. Todavia, os números das casas não dão a idéia da situação real, porque, dentro delas, os números dos irmãos e sua qualidade foram atingidos de modo significativo pelas transformações em curso.

No que respeita à vida religiosa, é justo observar o espírito de fidelidade dos irmãos que, na grandíssima maioria, vivem com lealdade e convicção – e também com uma boa, evangélica serenidade – sua vocação religiosa, o empenho no serviço pastoral e educativo, a vida fraterna, a fidelidade aos votos, a vida de oração e de formação contínua.

Diminuiu, naturalmente, o número dos irmãos presentes nas casas. E cresceu de maneira notável a idade média.
Não obstante, melhorou a atenção formativa: o dia da comunidade, a programação dos retiros e dos outros momentos fortes tiveram um impulso notável, especialmente após as propostas feitas pelo CG25.

6. A Família Salesiana
A Congregação está empenhada, na Itália, num caminho de descoberta e valorização da Família Salesiana. Os conselhos inspetoriais da Associação dos Cooperadores Salesianos e da Confederação dos Ex-alunos, por exemplo, estão chegando a uma boa maturidade. Os conselhos locais parecem ressentir-se mais da fragilidade das comunidades, que torna às vezes difícil achar o delegado justo. Também o MGS parece encaminhar-se para assumir responsabilidades crescentes no apostolado salesiano. Nunca, como neste momento, a Região sentiu tanto a necessidade de estar acompanhada por leigos salesianamente preparados e motivados.

7. Participação e formação dos leigos: recursos e problemas
As necessidades concretas das nossas obras e também a redescoberta de uma eclesiologia de comunhão centrada no povo de Deus, cuja co-responsabilidade evidencia, levaram nossas comunidades a um envolvimento dada vez mais vasto de colaboradores leigos, os quais se inseriram um pouco em todos os níveis, partilhando de maneira sempre mais consciente a espiritualidade e a missão salesiana.
Surgiu, especialmente nos responsáveis de casas e inspetorias, a consciência de que a referência formativa dos novos leigos não pode ser outra senão a indicada pelo CG24, isto é, uma formação salesiana comum, orgânica, contínua, visando às necessidades dos jovens e do território. Trata-se de uma verdadeira “formação em serviço”, acompanhada de atitudes que se tornam convite e provocação para crescer mais.

No quadro da Região foram tomadas interessantes iniciativas de formação notadamente para os professores, no setor escola. Um pouco por toda a parte surgiram escolas para os animadores dos oratórios. Também foram ativadas iniciativas de formação para os leigos inseridos em posições de responsabilidade gerencial ou administrativa.
É claro que o caminho de formação deve interessar-se por uma série de competências profissionais, mas o ponto-chave fica sendo a assunção do “espírito salesiano”. Somente assim, as obras da Região não perderão sua identidade.

Os grandes desafios da Região

A realidade implica também a tomada de consciência dos desafios atuais que a Região deve enfrentar. Indico as que reputo fundamentais.

1. A situação vocacional
A situação vocacional da Região Itália e Oriente Médio, e de modo especial da área CISI, permaneceu um tanto estacionária. No que respeita à Itália, deve-se ter presente que se em 1985 havia na Itália um milhão de jovens de 19 anos, em 2005 haverá somente 560 mil. Isso significa que, globalmente, os jovens sofreram uma redução perto dos 50%. O que não pode deixar de ter um impacto vocacional. Já dizia, anos atrás, o padre Viganó: “Se não há filhos para as famílias e para a sociedade, também não haverá para a Igreja e para as Congregações”.
Quanto à Inspetoria do Oriente Médio, já lembrei uma situação difícil em que se encontram os cristãos, com o sonho de muitos jovens de emigrar. Acrescenta-se a dificuldade de acompanhamento longo e personalizado, dada a escassez do pessoal disponível.

Não se pode dizer que há esterilidade na área CISI, como acontece em algumas regiões do Ocidente, mas talvez se note algum cansaço. O trabalho multiplicou-se um pouco para todos os irmãos e a preocupação com a animação vocacional corre o risco de ser um tanto abandonada, sobretudo em nível de comunidades locais, ou simplesmente entregue, como principal responsabilidade, ao animador inspetorial.
Decerto não se pode esquecer a qualidade cristã da proposta pastoral. O clima de secularização e de consumismo, a vasta gama de opções disponíveis, a diminuição dos filhos na família, a debilidade da pastoral de base por causa da diminuição do clero diocesano etc.: todos eles são elementos que exigem uma reorientação do projeto de pastoral vocacional, com especial atenção a uma evangelização suficientemente profunda para fazer encontrar, de fato, o Senhor Jesus e nutrir uma motivação robusta de “arriscar a vida” por Ele.

2. Redimensionamento e recolocação
A redução das forças salesianas deve levar a uma sábia revisão das nossas presenças no território da Região, particularmente na Itália. Como já dizia o meu predecessor, padre Vecchi, numa de suas cartas: “Muitas presenças são boas, mas nem todas falam com a mesma eloqüência, realismo e verdade. Muitas obras podem ser de alguma utilidade; nem todas exprimem o evangelho, o amor de Deus semeado no coração dos crentes com a mesma proximidade e profundidade. Muitas intervenções parecem aceitáveis, funcionais para a sociedade em que vivemos. Algumas são fortemente evangelizadoras e proféticas... Depois de cem e mais anos de vida salesiana na Itália, um esforço de redimensionamento e recolocação – embora com a necessária gradualidade e em proporção com as forças disponíveis – faz parte das atitudes de fidelidade a Dom Bosco” (cf. “Carta aos Inspetores da Itália e Oriente Médio”, 1997).

Esse empenho de redimensionamento e recolocação deve ser obviamente assumido por cada uma das inspetorias, mas deve também ser entendido como uma nova e mais orgânica distribuição das várias inspetorias no território nacional, que permita um fortalecimento das realidades mais fracas e uma melhor animação do conjunto. Algumas unificações, conquanto realizadas com processos alguma vez complexos e cansativos, deram, no fim, bom resultado.

Nesse processo, tanto em nível de cada inspetoria como em nível de CISI, é essencial manter uma atitude positiva e cheia de esperança. Entrincheirar-se nostálgica ou teimosamente em posições de defesa extremada de obras ou de circunscrições é uma atitude que não pode frutificar verdadeira renovação. Corre-se o risco de falta de concretude, com o perigo de ser convencidos pela própria história a tomar decisões que deveríamos sabiamente antecipar. É meu desejo aqui exortar os inspetores da Itália a abandonar uma estreita e por vezes muito fechada avaliação dos problemas da própria inspetoria e a ter uma visão mais ampla, cooperante, de verdadeira procura do bem de toda a presença salesiana na Itália. Para tanto, um caminho de revisão da própria orientação da CISI e dos seus organismos de animação pode também ser neste momento muito oportuno para dar com mais segurança orientações em nível nacional e coordenar-se unitariamente na solução dos problemas emergentes. Não se deve esquecer que, para Dom Bosco, as necessidades dos jovens é que devem determinar as nossas obras, e que, por isso, as estruturas têm valor na medida em que respondem a eles.

3. A formação contínua
A complexidade do tempo presente põe entre os desafios do momento o fato formativo como extremamente importante para poder viver e interpretar de maneira mais eficaz e testemunhante a nossa vocação e a nossa missão salesiana.
Essa atenção não diz respeito apenas às estruturas relativas à formação inicial que, todavia, estão presentes no território da Região com possibilidades ricas e bem consolidadas na experiência. A instância é dirigida a todos os salesianos que já se encontram em plena missão. A formação contínua, com efeito, nos permite ser atentos leitores do atual momento histórico e fiéis intérpretes do espírito de Dom Bosco num contexto moderno que exige grande ductilidade intelectual e pastoral para oferecer propostas, metodologias, soluções e, sobretudo, um anúncio e um acompanhamento educativo e cristão mais conforme à situação de hoje. Esse empenho de formação contínua deve envolver os irmãos do ponto de vista salesiano, pastoral, educativo e profissional.

Outra atenção, como já lembramos, será a formação dos leigos. Eles estão presentes de maneira cada vez mais maciça nas obras da Região. O cuidado desses nossos colaboradores, o garantir que possam ser bons intérpretes do estilo e do método educativo e pastoral salesiano é condição irrenunciável para que nossas obras possam manter sua verdadeira identidade carismática.
4. A presença salesiana no Oriente Médio

A Inspetoria Salesiana do Oriente Médio, que celebrou faz pouco o seu centenário, esteve sempre estreitamente ligada à Itália, mas há bom tempo o fluxo de missionários foi-se reduzindo... Atualmente conta cerca de 120 irmãos, que trabalham em 16 comunidades espalhadas por 7 nações da área: Egito (3), Palestina (2), Israel (3), Líbano (2), Síria (4), Turquia (1), Irã (1). Provêm da Itália 71 irmãos, 39 de países do Oriente Médio, o resto de outros 11 países. No Iraque há vários anos alguns irmãos desempenham, no verão, uma atividade de animação juvenil, na esperança de obter das autoridades licença para uma presença estável.

É um belo mosaico, mesmo que o fato implique dificuldades para enviar o pessoal mais idôneo para os diversos lugares. Podeis imaginar o desafio das línguas – árabe, hebraico, inglês, persa, turco –, e os problemas para a distribuição do pessoal e a transferência de um país para outro, quando necessário. Não se deve esquecer que não há relações diplomáticas entre Líbano, Síria, Iraque, Irã e Israel, onde se encontra a casa inspetorial.

As nossas obras são muito apreciadas pelas autoridades civis e eclesiásticas, notando que a inspetoria deve manter relações com pelo menos 6 patriarcas, com o mesmo número de núncios ou delegados apostólicos, e com 18 arcebispos. Como no caso da Etiópia-Eritréia, também aqui os ritos não são indiferentes.

Em tais circunstâncias, torna-se evidentemente difícil a coordenação pastoral ou uma programação inspetorial, porque o todo se realiza com uma grande descentralização. Todavia, os irmãos conseguem agir num estilo tipicamente salesiano, procurando inculturar o carisma e realizar a missão entre muçulmanos, cristãos das várias comunidades e ritos, praticando o ecumenismo e o diálogo inter-religioso na medida do possível. No Egito, no Cairo, cuidamos dos refugiados sudaneses. Na Turquia, em Istambul, dos meninos iraquianos e curdos. No Líbano e Síria, os oratórios e centros juvenis são as atividades principais. No ano passado, inauguramos o Centro de Formação Profissional de Al Fidar, no Líbano. Faço votos para que centros semelhantes a este possam ser construídos na Síria, no Iraque, na Jordânia e no Egito.

O grande problema continua sendo a guerra, que criou uma situação de emergência que se arrasta há 35 anos, como as guerras entre Israel e Palestina, a Revolução Islâmica, a Guerra do Golfo, as guerras civis no Líbano, a Intifada e, por fim, a última guerra no Iraque. Como vedes, a Inspetoria do Oriente Médio se encontra num território muito quente e atribulado, no qual nem bem acaba um conflito já começa outro.

Não se sabe até quando durará a situação, mas é evidente que os efeitos se prolongarão por muitos anos e alguns não serão reversíveis, como a islamização do Líbano e da Palestina devido à fuga dos católicos.

Como não nos empenharmos nesse contexto? E como não sermos orgulhosos desses nossos irmãos que nele já estão empenhados? Espero que, ao ler esta carta e conhecer melhor a situação dos nossos irmãos no Oriente Médio, as inspetorias e os irmãos individualmente se sintam chamados a ser solidários e a tornar-se disponíveis para revigorar e garantir a nossa presença nessa área. Há obras que são significativas pela sua colocação, que é mister salvaguardar.

Linhas de futuro

Diante de tais desafios é muito importante assumir linhas de compromisso que distingam o nosso empenho no próximo futuro.
Em vista disso, deixo indicações essenciais, endereçadas sobretudo aos irmãos da Região, para que façam delas motivo de aprofundamento.

1. Repensar a nossa proposta educativa pastoral
Esse é um empenho que visa a requalificar a nossa proposta educativa e evangelizadora. Trata-se de ir além do limiar da timidez apostólica, que corre o risco de fechar-se numa pastoral das atividades ou do entretenimento, e oferecer uma pastoral verdadeiramente missionária, capaz de envolver os jovens, de fazê-los crescer cheios de vida e orientá-los, numa experiência de fé, para um relacionamento pessoal com Jesus Cristo. É um trabalho de base, sobre o qual se apóia tudo quanto respeita à animação e ao acompanhamento vocacional. Esse caminho supõe o envolvimento dos salesianos com uma presença direta entre os jovens. A preferência em relação aos destinatários deve orientar-se com decisão para os últimos e os mais pobres. Concretamente na Itália, os jovens imigrantes deverão ser objeto de predileção, sobretudo num momento em que não faltam atitudes e políticas de exclusão e marginalização e às vezes de racismo. A Itália sempre se destacou por ser um país da alma grande e generosa, com uma cultura humanista muito rica, e uma história de direito romano. A Itália, além disso, foi uma nação de numerosos e grandes movimentos migratórios. Não pode, pois esquecer a sua experiência, como lembra o Deuteronômio a Israel: “Amai, pois, o estrangeiro, porque vós fostes estrangeiros no Egito” (Dt 10,19).

O que estou a dizer deve considerar-se válido para todos os ambientes em que os salesianos da Região estão atuando, mas penso em particular nas nossas escolas, que devem ser verdadeiramente mediadoras de uma cultura inspirada nos grandes valores do humanismo cristão e lugares de intensa animação juvenil, onde meninos e jovens podem encontrar acompanhamento e caminhos educativos ricos de propostas para o seu crescimento humano e espiritual.

Penso nos nossos centros de formação profissional, que são muitas vezes o lugar de encontro dos meninos mais frágeis. Neles podem regenerar-se numa experiência educativa em que o trabalho lhes dá nova dignidade e segurança, e ao mesmo tempo podem ser acompanhados no caminho cristão.

Penso nos nossos oratórios e centros juvenis e também nas nossas paróquias, que devem exprimir o “dom original” do carisma educativo de Dom Bosco, sem acanhar-se em propostas genéricas e sem distinguir-se pela riqueza do Sistema Preventivo.

Penso nas cada vez mais numerosas presenças universitárias, que permitem aos irmãos da Região tornarem-se acompanhadores e amigos de jovens adultos que se preparam para entrar na plenitude de experiência da vida e que muitas vezes manifestam grande atenção às propostas autênticas no plano cultural e cristão.

Há, pois, motivo, queridos irmãos, para fazer uma séria revisão e reencontrar os elementos mais genuínos da nossa espiritualidade e missão, renovando o nosso serviço aos jovens.
Esse caminho de requalificação da nossa proposta educativa e pastoral, unido a todas as iniciativas específicas, levará certamente a uma forte animação do ponto de vista vocacional.

2. Redefinir com coragem a presença salesiana na Itália
Tudo o que se puder fazer nessa linha será certamente um bom investimento para a missão dos salesianos na Itália e no Oriente Médio, no próximo futuro.
No caminho de redimensionamento e recolocação, entre os critérios que nos devem inspirar, mesmo num sábio e ponderado discernimento que já se está realizando nos vários Capítulos Inspetoriais, indico os seguintes:
• A atenção aos âmbitos humanos e às zonas mais pobres da Região, sob o perfil eclesial e civil. Devendo deixar alguma obra (alguma paróquia, por exemplo) é melhor começar a deixar os contextos sociais mais ricos.
• O cuidado de obras e iniciativas que visam a promover uma reproposta de fé no âmbito da nova evangelização.
• A manutenção de obras e estruturas que melhor nos permitem exprimir o carisma salesiano, tanto do ponto de vista educativo, como da evangelização. As obras, pois, que nos dão um contato mais vivo com os jovens, como os oratórios, os centros de formação profissional, as residências universitárias, os ambientes de voluntariado e serviço... Cuidado sobretudo em não esmagar o carisma sobre a “paroquialidade”.
• Defender a presença das “iniciativas de qualidade” representadas pelos centros de estudo, pelas editoras, pelos centros catequéticos, equipes de formação permanente, centros pedagógicos ou culturais, casas de formação... São lugares de expansão e difusão da nossa espiritualidade e da nossa pedagogia salesiana...
• Para as obras que têm também uma riquíssima história centenária, permanece como critério dominante o serviço aos jovens... Alguma vez, uma reordenação do serviço (uma recolocação interna) pode ser regenerante. Quando nem isso é possível, vê-se então claramente que o Senhor nos chama para outro lugar.

Também em nível de inspetorias é necessário proceder no discernimento e fazer amadurecer opções que dêem à Itália salesiana uma configuração jurídica mais adequada à situação atual. É bom que todos os irmãos saibam que essas opções devem fazer-se a fim de manter viva e forte a nossa presença na Itália. E isso deve ser um interesse de todos. Como disse em outras ocasiões, é questão de profecia e não de sobrevivência! A verdade é que não tomar decisões sobre este ponto significa caminhar sem futuro, destinados a uma morte natural. Mudar, perdendo alguma vez certa “segurança”, mostra vitalidade e vontade de deixar-se guiar pelo Espírito, que “renova a face da terra”.

Um último aspecto importante é a ligação entre as várias inspetorias, que deve inspirar-se em critérios de solidariedade e colaboração. Deve, pois, crescer a visão de conjunto, melhorando tudo o que pode contribuir para iniciativas unitárias e colegiadas, com um intercâmbio generoso de pessoal e recursos.

3. Qualificar o caminho de formação para os nossos colaboradores leigos
Já aludi acima à importância que devemos dar à formação dos nossos colaboradores. São muito numerosos em todos os contextos do nosso serviço educativo salesiano. Sua qualificação é indispensável para manter a identidade das nossas obras. Muitas são as iniciativas já em andamento, mas talvez deva-se cuidar mais o específico da nossa ação salesiana, ligado essencialmente ao conhecimento e ao aprofundamento do nosso Sistema Preventivo.

Além do conhecimento teórico, a aquisição desses conteúdos está ligada a uma verdadeira partilha de ideais e de vida que devemos fazer crescer com estes “salesianos externos”. Por isso, juntamente com as iniciativas específicas, deve-se qualificar o estilo de acolhida e partilha que devemos instaurar com os leigos colaboradores, fazendo-os participar muitas vezes também dos momentos específicos da nossa vida, como a oração e a partilha fraterna.

4. O apoio à Inspetoria do Oriente Médio
No início do sexênio pedi explicitamente que se inserisse esse ponto na programação do sexênio para a Região Itália e Oriente Médio. Entendia propor à Itália que se fizesse promotora de um Projeto que ajudasse a Inspetoria MOR a superar as atuais dificuldades ligadas às condições sociais e políticas que deve enfrentar, dando também ajuda em pessoal. É um convite que naturalmente dirijo hoje a todos e não somente aos irmãos italianos.
Concretamente, penso na oferta de um (pelo menos um) jovem irmão que cada inspetoria italiana pode fazer à Inspetoria MOR. Estou certo de que será uma verdadeira bênção para o próprio movimento vocacional da Itália.

Coragem, pois, jovens irmãos da Itália. Dirijo-me a vós porque as nossas presenças têm necessidade de pessoas jovens que possam aprender bem as línguas locais e inculturar-se nesse ambiente, fazendo dom da própria vida no carisma salesiano. Com Dom Bosco, continuo sonhador de novas presenças em que os salesianos se fazem amigos e educadores dos jovens. Eu mesmo estou sonhando estabelecer logo uma nova presença no Iraque, em Bagdá. O contexto político e social desse país nos chama a dar um sinal do nosso compromisso, porque é mais fraco e pobre. Com o dom antecipado dos primeiros noviços iraquianos, talvez Deus já está dando a perceber de maneira explícita seu apelo a concretizar esse sonho.

5. Valorização dos lugares salesianos
Gostaria de lembrar-vos uma última urgência, caríssimos irmãos da Itália. A valorização plena dos que consideramos os “lugares santos” da nossa espiritualidade e do nosso carisma: os lugares salesianos. Entendo referir-me diretamente ao Colle Don Bosco, à cidadela de Valdocco, aos lugares de Domingos Sávio e dos outros nossos santos salesianos, mas também aos outros lugares que conservam ainda viva a memória de Dom Bosco, também em outras cidades, como Gênova Sampierdarena, ou o Sacro Cuore de Roma.
Tais lugares são mantidos e cuidados com amor, não somente do ponto de vista material, mas também no que concerne às propostas de peregrinação, animação e formação. São, na realidade, “escola de espiritualidade e cenáculo de oração”.

É um patrimônio confiado à Itália, mas interessa toda realidade mundial da Congregação. É uma riqueza espiritual não ainda plenamente valorizada. Também esse empenho se prende a um movimento de renovação espiritual e pastoral que estamos mais diretamente colimando nestes anos.

Estou próximo de todos vós

Ao fechar esta carta, sabendo que me dirijo a todos os irmãos do mundo, deixai-me expressar minha proximidade particular aos irmãos da Região Itália e Oriente Médio. Muitas vezes disse que as pessoas dos irmãos são o bem maior da Congregação e, hoje, digo-o, repito-o com maior convicção após haver visitado mais de cinqüenta inspetorias no mundo.
Neste momento quereria dizer, antes de mais, a minha proximidade aos irmãos idosos e doentes. Deram toda a vida pelo bem dos jovens, pelo crescimento das obras salesianas. Hoje oferecem a sua extraordinária contribuição com a oração, a oferta cotidiana de sua situação de enfermidade e velhice.

Uma saudação particular também aos mais jovens. Lembro-me de vós todos os dias e vos apresento ao Senhor para que vos dê coragem, entusiasmo, capacidade de comunhão e de iniciativas apostólicas, perseverança. As gerações que vos precederam vos entregam uma Itália salesiana rica de obras e iniciativas, mais, rica sobretudo de grande fidelidade a Dom Bosco e ao seu espírito. Sede dignos continuadores, enfrentando os desafios do presente com serenidade e responsabilidade, mas sobretudo tende o coração cheio de grande “paixão por Deus” e de grande “compaixão pelo homem”, pelos jovens de hoje que são os vossos destinatários. Se a caridade pastoral arder dentro de vós, sereis verdadeiros salesianos segundo o coração de Dom Bosco, e da vossa vida certamente surgirão outras vocações.

Uma saudação cheia de afeto também a vós, salesianos adultos ou de idade madura, que carregais cotidianamente o grande peso do trabalho nas nossas obras. Obrigado pela vossa fidelidade, pelas vossas fadigas, pela vossa esperança que não esmorece, pela fé que anima a vossa vida, pelo amor que colocais na missão juvenil. Em Dom Bosco vos digo a minha proximidade, a minha estima e o meu afeto.

A vós todos, queridos irmãos, de qualquer região ou inspetoria, o meu convite a louvar a Deus pelo bem que o Senhor, através do carisma salesiano, operou na Região da Itália e do Oriente Médio. É justamente o caso de dizer que “grandes coisas fez o Senhor e santo é o seu nome...”. Assim foi na Itália e assim foi em muitos países do mundo, “até aos confins da terra”.

Concluindo

Confio cada um de vós aos cuidados maternos de Maria Auxiliadora, a “Madonna” de Dom Bosco, que lhe foi mãe e mestra e continuará a sê-lo para todos nós, a que o guiou em todas as suas iniciativas em favor dos jovens que Deus que havia confiado, e continuará e guiar-nos também.
A festa da Anunciação, na qual vos envio esta carta, lembra-nos as atitudes que se devem cultivar para saber ouvir a Deus e responder a Ele, que não cessa de falar-nos e chamar-nos na história. Podem resumir-se em três grandes atitudes.

A procura do plano de Deus para a própria vida, sabendo que Deus tem um plano para cada um de nós e no-lo vai revelando à medida que indagamos o que Ele quer de nós em favor dos outros. A palavra de Deus, a sua “anunciação”, chegará através de acontecimentos, de pessoas e da Sagrada Escritura. De aí a necessidade de converter-nos em ouvintes atentos da Palavra e em leitores crentes da história. Neste sentido parece-me muito eloqüente ver Maria representada em muitos quadros da Anunciação com a Sagrada Escritura na mão ou nos joelhos, meditando-a, como se quisesse acolhê-la no seu coração. Maria nos ensina, em primeiro lugar, a prestar atenção: “Ela começou a pensar qual seria o significado da saudação”, diz o evangelho (Lc 1,29).

• A aceitação da vontade de Deus como projeto de vida, reconhecendo que o projeto de Deus será sempre melhor que o nosso. Abrir-se a Deus significa admitir a própria situação de criatura, limitada, propensa a fabricar para si, na própria medida, ídolos e deuses. Admitir Deus na própria vida implica reconhecer sua senhoria, não depender de nenhum outro, não ter outras prioridades em nossa vida, identificar-nos com a sua vontade, fazendo-a inteiramente nossa. Não se pode ser verdadeiro crente e pretender dispor de Deus, querer que seja Ele quem faça a nossa vontade e realize os nossos desejos. Maria nos ensina, em segundo lugar, a crer em Deus, confiar nEle, dar-lhe espaço em nossa existência como Aquele que é amado porque nos amou por primeiro, porque pensou em nós. “Eis a serva do Senhor. Cumpra-se em mim o seu projeto” (cf. Lc 1,38).

• A docilidade ao Espírito de Deus, que torna possível em nós o impossível. O relato evangélico nos diz que pela obra de Deus, que é o próprio Espírito Santo, Maria pôde ser Mãe de Deus. É a docilidade ao Espírito que torna fecunda a Virgem Maria. Demonstra-o o fato de que, visitando Isabel, ouviu em resposta à sua saudação: “Bendita entre todas as mulheres e bendito o fruto do teu ventre” (Lc 1,42). A vivência profunda dessa energia divina permite a Maria sentir-se livre para poder dispor de si e fazer-se escrava do seu Deus. Tal é o sentido profundo da “virgindade” de Maria, que, mais que uma afirmação de um elemento físico, é a total disponibilidade a seu Deus: “Para Deus nada é impossível” (Lc 1,36).

Maria nos ensine a acolher o plano de Deus e a colaborar com Ele para levar a termo sua obra de salvação.
Desejo a todos um fecundo caminho quaresmal e Boa Páscoa!

Pe. Pascual Chávez V.
Reitor-Mor