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« Vós sois o sal da terra... (Mt 5, 13.14) Apresentação da Região Ásia Leste e Oceania

CARTA DO REITOR-MOR : ACG 397


APRESENTAÇÃO DA REGIÃO ÁSIA LESTE E OCEANIA

Vós sois o sal da terra... Vós sois a luz do mundo(Mt 5, 13.14)

APRESENTAÇÃO DA REGIÃO ÁSIA LESTE E OCEANIA

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Rome, 25 de fevereiro de 2007
Festa dos Santos Mártires Luís Versiglia e Calisto Caravario


Caríssimos Irmãos,

depois da carta de apresentação da Região Ásia Sul, tenho o prazer de vos falar agora da Região Ásia Leste e Oceania. Mais do que em outras partes do mundo, aqui os cristãos em geral e os religiosos em particular, são chamados a ser "sal da terra" e "luz do mundo". Diante de povos com tradições religiosas antiqüíssimas e veneráveis, que permeiam em larga medida a sua cultura, é natural que o cristianismo seja visto como religião ocidental e, portanto, estrangeira e estranha. Por isso, os seguidores de Jesus devem dar provas de que o cristianismo, além de saber conviver com outras formas religiosas intensamente enraizadas naqueles povos, é uma religião que se pode inculturar em todas as culturas do mundo sem se identificar, porém, com qualquer uma delas, pois todas devem ser purificadas e elevadas por Cristo. Há necessidade, sim, de um esforço qualificado e custoso de inculturação, mas isso exige do cristão, antes de tudo, uma identidade transparente. No sermão da montanha, Jesus nos diz que ser discípulo é uma questão de ser, não de fazer. E isso é, em todo caso, expressão do quanto se é "sal" e "luz", ou seja, discípulos autênticos de Jesus que não hesita em dizer qual seria a sorte dos seus seguidores caso perdessem a própria identidade, a mesma do sal que perdeu o sabor: «Para nada mais serve senão para ser lançado fora e pisado pelos homens».

Nossa vida deve sobressair-se pela altíssima qualidade espiritual e pelo agir permeado de caridade, de modo que os dois aspectos, experiência de Deus e missão, nos tornem uma presença transfiguradora de Cristo que dê luz a todos os que estão na casa. Eis o auspício de Cristo, que faço meu: «Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos céus» (Mt 5,16). Ao falar da vida cristã como anúncio, João Paulo II escreve na Exortação Apostólica Ecclesia in Ásia: «Este anúncio é uma missão que precisa de homens e mulheres santos que farão conhecer e amar o Salvador através de sua vida. O fogo não pode se aceso senão através de alguma coisa que também esteja inflamada» (n. 23). Para nós, Salesianos, essas imagens de sal e de fogo encontram o seu equivalente na paixão espiritual e apostólica do Da mihi animas, que cada irmão é chamado a despertar no próprio coração.

Nesta área do mundo, da Igreja e da Congregação, não haveria contradição maior do que uma presença cristã religiosa salesiana secularizada, sem uma clara e arrebatadora experiência de Deus, uma presença aburguesada, sem o trabalho solidário pelos mais pobres, que seja sinal eficaz do Reino.

A Região Ásia Leste e Oceania, que compreende 20 países, embora tenha sido a última a ser constituída no último Capítulo Geral, celebrou recentemente o centenário da chegada dos primeiros missionários. Eles chegaram a Macau, na China, em 13 de fevereiro de 1906, para fundar aquela que é a primeira e mais antiga presença - praticamente ininterrupta - de toda a Região. Ela pode ser considerada, com razão, o 'berço' das obras salesianas na Ásia Leste. A obra salesiana na Região é uma árvore já secular, à qual não falta vitalidade e promessas para o futuro. Conta, de fato, com um número não indiferente de novas presenças, também recentes. Naturalmente, sendo uma Região tão diversificada em sua composição, compreende áreas nas quais a Congregação cresce com vigor e fecundidade, e outras nas quais a Congregação olha com interesse e esperança. Trata-se de uma realidade completa e dinâmica, tanto que nos últimos 40 anos, as Inspetorias e Visitadorias que a compõem pertenceram sucessivamente a diversas circunscrições regionais. A opção do CG25 por criar uma Região a sé parece corresponder melhor à realidade e às necessidades das Inspetorias, da Visitadoria e Delegação que a compõem.

A Região estende-se às seguintes Nações: Austrália, Camboja, China (Hong-Kong e Macau), Coréia do Sul, Filipinas, Ilhas Fiji, Ilhas Salomão, Indonésia, Japão, Laos, Mongólia, Papua Nova Guiné, Paquistão, Samoa, Tailândia, Taiwan, Timor Leste, Vietnã.

Ela compreende as seguintes Circunscrições: as Inspetorias da China, Austrália, Japão, Tailândia, Filipinas Norte, Filipinas Sul, Vietnã, Coréia; a Visitadoria da Indonésia e Timor Leste; e, enfim, a Delegação de Papua Nova Guiné e Ilhas Salomão.

Nos primeiros cinco anos de existência desta nova Região, viram-se muitas vantagens em poder acompanhar mais de perto cada circunscrição e coordenar o conjunto. A Visita de conjunto de 2005, realizada em Hua Hin (Tailândia), reforçou o sentido de Região, sobre o que se vinha discutindo há pelo menos 18 anos e se estava experimentando em diversos setores (Inspetores, Dicastérios, atividades). [1] Em Hua Hin, contudo, chegou-se ao verdadeiro sentido de Região, ao crescimento na colaboração e à vontade clara de coordenação, expressos no Documento "Vision - Mission".

Contemplando a situação nas diversas realidades da Ásia Leste e Oceania, onde o cristianismo representa uma autêntica minoria, percebe-se logo como os Salesianos são chamados a ser 'sal' e 'luz', a exigência que eles têm de viver a vida consagrada como missionários 'inter gentes' e a sua tarefa de ser 'missionários dos jovens'. A Igreja Católica e, nela, a Vida consagrada e a Congregação Salesiana, vive imersa no oceano de diversos povos, de antigas religiões e de culturas com raízes religiosas profundas mas não cristãs.

Isso torna mais urgente o empenho de inculturação, a fim de enraizar a vida salesiana nos vários contextos e torná-la relevante e fecunda preocupando-se com a identidade cristã e carismática e dando atenção às diversidades culturais. Ao mesmo tempo, ser minoria entre as populações exige de nós nesta Região um empenho decidido para desenvolver a dimensão missionária da vocação salesiana, fazer crescer a missionariedade dos irmãos e das comunidades e dar prioridade à evangelização. Trata-se de um empenho de longo prazo, que exige no Salesiano uma capacidade não inata ao diálogo com as culturas e religiões locais. [2]

 

1. Uma breve apresentação global da Região

A área geográfica da Região é muito extensa. O traço mais evidente é a variedade dos contextos e das situações nas quais nossos irmãos vivem a própria vida religiosa e desenvolvem a missão salesiana. Não é fácil descrever de maneira breve uma realidade sociopolítica e religiosa tão variada. Tento aproximá-la de vós em algumas pinceladas,.

A realidade social

Entre as nações compreendidas pela Região, encontramos algumas que só recentemente saíram de situações de guerras, de luta pela própria autonomia, às vezes de guerras ideológicas, civis, com genocídios horrendos. Pode-se dizer que a Região agora é pacífica e se dedica com energia ao próprio desenvolvimento econômico, social e civil, embora não faltem tensões e lutas de matrizes racial, religiosa ou polícia (Timor Leste, Aceh Livre, Ilhas Fiji, Ilhas Salomão, o sul da Tailândia e as Filipinas).

A área da Ásia Leste e Oceania compreende quase um terço da população mundial e ali se fala um terço das línguas do mundo todo. 60% da população têm menos de 21 anos de idade. Só a China, com seu bilhão e trezentos milhões de habitantes, tem um específico peso demográfico, econômico e político superior, não só ao de outras nações, mas de continentes inteiros. Sua abertura econômica e de mercado, a partir de 1979, e sua recente entrada no âmbito da política internacional fazem dela um sujeito que naturalmente influi e influirá sempre mais no futuro da vida social, econômica e política no mundo inteiro. A Região enquanto tal é intensamente envolvida - se não até mesmo na vanguarda - em mudanças vastas, rápidas e profundas, que estão criando realidades contrastantes de luzes e sombras: vida e morte, pobreza e riqueza, progressos e regressos sociais, conquistas e derrotas. Trata-se, de fato, de uma Região formada por dois continentes e por culturas e religiões diversas.

Vivem na Região quase 40% dos não cristãos do mundo. Os católicos são apenas 100 milhões, formando uma diáspora correspondente a 5% da população (100 milhões sobre os cerca de 2 bilhões de habitantes na Região). Constata-se, de um lado, um despertar religioso, e de outro, a subordinação crescente dos valores religiosos ao desenvolvimento econômico, sobretudo nas grandes cidades. Perguntamo-nos: será justo falar de "secularização" na sociedade asiática, um processo que se desenvolveu essencialmente no âmbito cultural cristão-ocidental? Segundo a reflexão feita em nossos encontros de animação missionária na Ásia não se pode dizer que exista secularização, sendo mais justo falar de "subordinação ou sujeição dos valores religiosos ao desenvolvimento econômico". Poder-se-ia falar de ateísmo prático com uma mistura de religiosidade social.

Ali estão presentes quantidades mais ou menos amplas de fundamentalismo, como reação às enormes mudanças sociais e culturais, que o povo não sabe enfrentar. A crise econômica no leste asiático há pouco superada (1997-1998) levantou muitas questões sobre o modelo econômico que estava por detrás do chamado 'milagre asiático', a sua correlação com os valores culturais, as insuficiências e inadequações, o crescente degrado ambiental, as disparidades sociais e o desfrute da mão-de-obra, a necessidade crescente de energia e de matérias primas, as tensões e falências postas a nu pelo terrível tsunami de 2004 e pelos atentados de Bali de 2002-2004.

Coexistem nessa área formas variadas de governo, já afirmadas ou em evolução: ao lado de democracias antigas e novas (Japão, Filipinas, Taiwan, Austrália), encontramos sistemas socialistas, monarquias tradicionais (Tailândia, Camboja, Japão) e ditaduras militares. Particularmente a China e o Vietnã, com a Coréia do Norte e o Laos, representam o último grande bloco de ideologia e totalitarismo de matriz marxista. Todos estão enfrentando fenômenos comuns, já mencionados, e que tendem a estender-se; a brecha entre ricos e pobres, a fuga do campo e a urbanização, com o conseqüente deslocamento cultural, a industrialização pouco atenta ao ambiente e a crescente injustiça social correm o risco de subverter antigos equilíbrios. Cresce a consciência política democrática, e inevitavelmente, embora de modo marginal, refere-se até mesmo aos países de regime comunista.

O contexto cultural

Distinguem-se, fundamentalmente, quatro sistemas de valores culturais.

O primeiro e mais sólido é o sistema Leste Asiático, com raízes confucionistas e/ou budistas, cuja influência estende-se a grande parte da Região. Esse sistema põe sua força nos valores familiares e comunitários; dá prioridade aos deveres do indivíduo para com a família, os anciãos ou o clã e, no pólo oposto, para com os governantes. O estudo e o trabalho diligente são considerados importantes.

O sistema Islâmico de tipo asiático é, em geral, mais moderado e tolerante do que o Islã da zona árabe, e está misturado com diversos valores de animismo popular. Encontramos também um ambiente misto nas Filipinas, onde a cultura da maioria malaia está marcada por uma longa colonização espanhola.

O sistema Pacífico da Melanésia e Polinésia está centrado no animismo, núcleo familiar-tribal, e na partilha dos bens.

Por último, o sistema Ocidental racionalista e libertário, que está surgindo na Região e traz consigo as raízes da visão cristã e da reação racionalista a ela. Como nota a Exortação Apostólica Ecclesia in Oceania (cf. n. 6), este sistema, presente na Austrália e típico dela, tem seu foco na felicidade, no sucesso, com crescente individualismo e intensa secularização.

Enquanto constatamos a presença desses diversos sistemas de valores e contextos culturais, vemos, ao mesmo tempo, que a forte migração local e internacional favorece também a mistura dessas raízes e matrizes culturais e religiosas.

A presença da Igreja Católica

A maioria dos católicos da Ásia Leste está concentrada nas Filipinas, país com elevado percentual católico (81% dos 84 milhões de habitantes), embora não sem tensões. Outros dois países com um percentual notável de católicos são Timor Leste (90%) e Coréia do Sul (11%) que, juntos, possuem 30% dos católicos. Quanto ao mais, o catolicismo na região vive a realidade de diáspora, com percentuais que vão do mínimo de 0,4% (Tailândia, China, Japão) aos 6% (Vietnã) da população.

Trata-se de uma Igreja jovem, com vitalidade e coragem às vezes extraordinárias, como na Coréia do Sul e no Vietnã. Embora em alguns lugares a Igreja ainda seja considerada uma religião ocidental, estrangeira, ela é vista em geral de modo muito positivo. Mesmo que em muitas partes da Região, a evangelização seja relativamente recente, ela colocou raízes profundas, graças, também, aos inúmeros mártires dos últimos três séculos, muitos dos quais já canonizados ou ao menos beatificados (120 da China, entre os quais os nossos São Luís Versiglia e São Calisto Caravario, 177 do Vietnã, 103 da Coréia, 247 do Japão, 8 da Tailândia, 2 das Filipinas, 1 de Papua Nova Guiné).

Acompanhando a caminhada da Federação das Conferências dos Bispos da Ásia (FABC) nos últimos trinta anos, aprecia-se o empenho de aprofundamento das orientações para a evangelização integral no ambiente asiático. Um dos principais valores dessas culturas - a harmonia - sugere como via imprescindível da missão um quadrúplice diálogo (diálogo de vida - de ação - de intercâmbio teológico e da partilha de experiências religiosas), através do qual o Evangelho deve ser compartilhado e comunicado aos concidadãos das antigas religiões não cristãs. Evento histórico foi o 1